Ana D´Avila | Almodórviana

Três da madrugada. Sem sono, ela parecia personagem dos filmes de Almodóvar. Gênero melodrama: olhar de sofrimento. Preocupação com a vida e o lixo.Um mosquito insolente sobrevoou seu braço nú. À tarde, havia pintado suas unhas com esmalte vermelho. Que borrou as bordas de seus dedos.Mais uma vez, Almodóvar. Escarlate!

Sua mente ficava vazia. Como na meditação, como na yoga.Seu estômago também. Comprará uma caneta Bic, igual a do Presidente da República.Provando talvez, seu desapego com a riqueza estabelecida.De tinta azul,com ela colocou palavras numa folha de ofício branca. A cor da paz. Ao longe, roncos.Incertezas. E a serenidade da noite. Com suas sombras mescladas de luz. Com seu mistério apocalíptico.

Na cozinha, copos e xícaras por lavar. Na mesa, pão, mel e bolachas. Amanheceria. E o café seria certeiro.Com a abertura das bananinhas. Que não eram lá tão pequenas. Haveria agrotóxicos nas bananas? Estaria ligeiramente envenenada? Só isto! Envenenada, como todas as pessoas nas grandes cidades estão. Pela boca e pelos ouvidos. A cidade estava quieta. De vez em quando, um gato assombrava com miados estéricos. Deveria ser um casal de gatos copulando.

Uma mulher da Nova Zelândia aparecia no seu Instargram. Era bonita. Sua cidade limpinha. Aqui no Brasil, lixo em todos os cantos, dando alergia só de olhar. Onde as cidades brasileiras irão parar com estas toneladas de lixo se avolumando por aí?

Sei não! Começo a me preocupar. São garrafas ,papéis, restos de comida e sacolas plásticas. Já nem falo nos canudinhos. Estes, não são mais notícia. Na rua, descartam todo tipo de lixo. Até sofás, colchões e ventiladores.

A moça da noite chamava-se Maristela. Um lindo nome dado por seus pais, pensado muito antes de seu nascimento. Vierá ao mundo numa gritaria. Num choro magistral. As enfermeiras da maternidade concordaram que o choro da menina era bastante forte. “Que pulmões tem este bebê”! Já inclusa na humanidade, permanecia já aos sessenta anos de idade, maravilhada com o viver, apesar de alguns embaraços existenciais. Bem tema da obra cinematográfica de Pedro Almodóvar.

Maristela pensará em fazer teatro ou cinema como o cineasta espanhol. Mas ficava só na tentativa. Haveria tempo ainda para apostar numa nova profissão? Era médica, mas gostava do jornalismo.De unhas vermelhas na madrugada de insônia pôs-se a refletir.

E pensando na obra de Almodóvar , amanheceu. Sem reparar, havia passado à noite em claro. Por ser médica, haveria de se auto-medicar com algum calmante leve. Apagar o celular. Desligar o note- book e finalmente dormir. Seu consultório funcionava somente à tarde. Ainda bem!(Ana D´Avila) 

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