O Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) autorizou o ‘abate’ de animais no Pampas Safari, parque privado que explorou espécies silvestres comercialmente por quatro décadas no Km 11 da ERS-020, em Gravataí.
Por unanimidade a 4ª Turma negou recurso do Movimento Gaúcho de Defesa Animal (MGDA) que pedia que o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) fosse impedido de autorizar ou realizar o abate de qualquer animal, sem a comprovação técnica da necessidade de tal procedimento.
Traduzindo do juridiquês: mesmo sem a realização de exames comprovando doenças, o Ibama pode determinar o sacrifício dos animais. É a matança legalizada dos cervos.
Conforme nota do TRF4, o parque zoológico encerrou as atividades e está fechado desde 2016. No local, o Ibama constatou problemas de surtos de doenças entre os animais, cancelando a licença de funcionamento do empreendimento. Em 2007, ocorreu um surto de tuberculose nos búfalos, sendo que todos os animais da espécie foram abatidos. Já em 2013, outros casos da doença foram identificados em cervos, macacos e capivaras, o que teria motivado a interdição do parque.
O MGDA ajuizou a ação civil pública contra o Ibama, em setembro de 2017, requerendo a comprovação técnica da necessidade de abate dos animais que restaram no zoológico após o encerramento das atividades.
Em agosto de 2019, o juízo da 9ª Vara Federal de Porto Alegre proferiu sentença julgando os pedidos da ação improcedentes. A magistrada de primeira instância entendeu que o Ibama tem o direito de determinar a destinação dos animais do plantel do Pampas Safari, e que o Judiciário não poderia vedar ou autorizar qualquer ação do órgão ambiental, por falta de conhecimento técnico sobre o assunto.
A parte autora recorreu da decisão ao TRF4. A 4ª Turma negou a apelação, após verificar que as ações do Ibama estariam respaldadas por decreto, que instruía que animais contaminados ou que tiveram contato com animais doentes, inclusive em casos de tuberculose, podem ser sacrificados.
O desembargador Luís Alberto d’Azevedo Aurvalle, relator do processo, destacou que “o entendimento da sentença quanto à discricionariedade do Ibama para decidir sobre a sorte dos animais está respaldado pelo Decreto nº 27.932-1950: ‘são passíveis de sacrifícios os animais atacados de mormo, raiva, pseudo-raiva, tuberculose, pulorose, peste suína e quaisquer doenças infecto-contagiosas não oficialmente reconhecidas como existentes no País, bem como todos aqueles que, tendo tido contato, direto ou indireto, com animais doentes, sejam, a juízo da autoridade sanitária competente, considerados suspeitos de contaminação e possam representar perigo de disseminação da doença’.
– Considerando que mais de 70 animais do rebanho em questão já tinham morrido em razão de tuberculose, entendeu o Ibama ser desnecessária a realização de exame sanitário em cada um dos demais integrantes do rebanho, com apoio no decreto – concluiu o magistrado.
Ao fim, não resta dúvida de que, com a decisão, os animais serão abatidos.
O DIário de Viamão, e outras mídias, publicaram séries de artigos, e diversos movimentos foram tentados por ativistas do Brasil inteiro, desde que foi revelada a morte de animais no Pampas. O apelo principal era para que animais fossem testados antes do sacrifício.
O que ‘secretamente’ já não ocorreu no fim de 2017, em ação na qual Ibama e Secretaria Estadual do Meio Ambiente garantiram toda a instrumentação necessária para que os proprietários da área dessem um fim nos animais sob o selo da causa sanitária e de maneira indolor aos animais.
Foram abatidos 300 em um frigorífico do interior.
O repórter Carlos Rollsing, de Zero Hora, também revelou à época que partiu do órgão federal a orientação para que os funcionários do Pampas tivessem seus celulares recolhidos pelos patrões no período de embarque dos 300 cervos para o abate, entre 30 de novembro e 12 de dezembro, supostamente para evitar a circulação de imagens que pudessem mobilizar organizações de proteção animal.
Como bem descreveu à época o jornalista Eduardo Torres, no DV, o Ibama agiu para bloquear defensores de animais e não teve o mesmo zelo quando, meses antes, um grupo de cervos, comprovadamente não nativos da região da bacia do Gravataí, apareceu na madrugada circulando pelas ruas de Gravataí.
Conforme o Comitê de Gerenciamento da Bacia do Rio Gravataí, não havia relatos recentes da existência de cervos do pantanal tão próximos da zona urbana de Gravataí. O local da primeira aparição ficava a 10 quilômetros do Pampas – onde são mantidos cervos exóticos, principalmente os conhecidos como vermelho – e a cerca de 50 quilômetros do Refúgio de Vida Silvestre Banhado dos Pachecos.
A Fundação Municipal do Meio Ambiente foi acionada, mas a superintendência regional do Ibama se apressou em afirmar que a jurisprudência, se acaso houvesse relação com o Pampas, seria federal.
Parecia interesse em investigar, não era.
A própria superintendente, à época, disse que o caso só seria apurado se provocado pela Justiça Federal. O que não ocorreu. E até hoje ninguém sabe de onde saíram e para onde partiram. Tuberculosos ou não.
Ao fim, resta aos ativistas velarem mais essa derrota de animais indefesos frente à justiça dos homens.
Inegável é que fica mais fácil para os proprietários fazer negócios com a área de 300 hectares, cada vez mais valorizada em uma das regiões para onde Gravataí mais cresce e recebe investimentos públicos.
‘Condomínio Cemitério de Cervos’, sugiro, caso construam um empreendimento imobiliário.
Assista protesto de ativistas no Ibama em 2017