Prisão de Duran é ilegal. E o caso do sogro pai do sócio namorado da filha

Desembargador Marcelo Malucelli

Recomendamos o artigo do jornalista Reinaldo Azevedo, publicado pelo UOL


Há coisas que são mesmo do balacobaco.

Vocês já estão sabendo, a esta altura, que o desembargador Marcelo Malucelli, do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, mandou prender de novo o advogado Rodrigo Tacla Duran, ordem que tinha sido revogada pelo juiz Eduardo Appio, da 13ª Vara Federal de Curitiba. Malucelli é o relator dos casos relativos à Lava Jato no TRF-4. Relembremos: em depoimentos prestado a Appio, Duran reiterou a acusação de que foi vítima de extorsão praticada por Carlos Zucolotto, compadre de Moro e ex-sócio de sua mulher, a agora deputada Rosângela Moro. Um problema: conforme revelou Lauro Jardim, no Globo, o desembargador é pai de João Eduardo Barreto Malucelli, sócio de Moro e de sua mulher no escritório Wolff & Moro Sociedade de Advogados. Mais: é namorado da filha do agora senador. Isso caracteriza impedimento ou suspeição? Já volto ao ponto. Sigamos.

Se suspeição ou impedimento podem render alguma polêmica, há algo inquestionável: a decisão é ilegal. O processo que envolve Tacla Duram havia sido suspenso pelo então ministro Ricardo Lewandowski, do STF em razão de fundadas suspeitas de nulidade das provas. Logo, um magistrado de instância inferior não pode praticar nenhum ato processual. Decretar prisão preventiva, então, nem pensar! Quando menos, Duran, que advoga para si mesmo, deve entrar com uma Reclamação para lembrar que a competência, nesse caso, é do Supremo.

Tacla Duran acusa Zucolotto, o compadre de Moro, de lhe ter cobrado US$ 5 milhões, com o conhecimento do então juiz e de Deltan Dallagnol, para ajeitar as coisas na Lava Jato. Afirma ter provas de que pagou parte da extorsão. Teria repassado US$ 613 mil a outro advogado, Marlus Arns, amigo de Rosângela. Teria desistido de pagar o resto e se mudou para a Espanha, já que tem dupla cidadania. Nota: a força-tarefa nunca o ouviu oficialmente.

Notem bem: a denúncia feita por Duran se transformou numa notícia-crime contra Moro, Dallagnol, Zucollotto e Fábio Aguayo, hoje assessor do senador, caso que, reitere-se, tramita no STF. Pode-se achar que a prisão de Tacla Duran, justamente o denunciante, não tem nada com isso, o que seria, convenham, absurdo.

O Artigo 252 do Código de Processo Penal traz as causas de impedimento, que são as razões, digamos, objetivas. Transcrevo:

Art. 252. O juiz não poderá exercer jurisdição no processo em que:

I – tiver funcionado seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim, em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, como defensor ou advogado, órgão do Ministério Público, autoridade policial, auxiliar da justiça ou perito;

II – ele próprio houver desempenhado qualquer dessas funções ou servido como testemunha;

III – tiver funcionado como juiz de outra instância, pronunciando-se, de fato ou de direito, sobre a questão;

IV – ele próprio ou seu cônjuge ou parente, consanguíneo ou afim em linha reta ou colateral até o terceiro grau, inclusive, for parte ou diretamente interessado no feito.

Moro alegou em nota que ele e sua mulher estão afastados do escritório de que o filho de Malucelli, João Eduardo Barreto Malucelli, é sócio. Restaria, nesse caso, que o desembargador, por conta própria, se declarasse suspeito — caso ninguém viesse a argui-lo. Parece-me, no entanto, que o fato de João Eduardo ser genro de Moro, mesmo inexistindo uma união formal com sua filha, incide no Inciso IV do Artigo 252 do CPP. A menos que se tente demonstrar que a eventual prisão de Duran não é do interesse do senador.

Só para lembrar, dispõe o Artigo 252 sobre a suspeição:

Art. 254. O juiz dar-se-á por suspeito, e, se não o fizer, poderá ser recusado por qualquer das partes:

I – se for amigo íntimo ou inimigo capital de qualquer deles;

II – se ele, seu cônjuge, ascendente ou descendente, estiver respondendo a processo por fato análogo, sobre cujo caráter criminoso haja controvérsia;

III – se ele, seu cônjuge, ou parente, consanguíneo, ou afim, até o terceiro grau, inclusive, sustentar demanda ou responder a processo que tenha de ser julgado por qualquer das partes;

IV – se tiver aconselhado qualquer das partes;

V – se for credor ou devedor, tutor ou curador, de qualquer das partes;

Vl – se for sócio, acionista ou administrador de sociedade interessada no processo.

Impedimento ou suspeição? Haverá quem diga que nem uma coisa nem outra. A mim, o impedimento parece claro, destacando que o óbice ético remanesce em qualquer hipótese. Convenham que seria compreensível que uma ceia de Natal reunisse o namorado e seu pai; a namorada e seu pai. Seria o que se chama “Natal em família”, certo? Impedimento.

O que não está sujeito a controvérsia, no entanto, é mesmo a ilegalidade do ato: um juiz de segunda instância está ignorando um feito do Supremo. Depois da decisão de Lewandowski, Malucelli não poderia ter praticado qualquer feito no caso. Muito menos decretado a prisão daquele que acusa o sogro do seu filho. Dá quase para fazer um Powerpoint com as relações familiares…

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