Quando abriu a coletiva na qual anunciou à imprensa novas medidas para tentar frear o avanço do coronavírus em Viamão, Valdir Bonatto ainda não havia sido informado sobre a cruel atualização da pandemia. Nesta terça-feira (2) em que o chefe do Poder Executivo prometeu mais agilidade no diagnóstico e na atenção dos casos confirmados, a frieza dos números deu razão a um prefeito que minutos antes verbalizava preocupação a jornalistas e representantes da mídia local.
Já são 302 vidas perdidas para a COVID-19 no município entre maio de 2020 e 1º de março deste ano. De acordo com números do governo do Estado, ocorreram 15 óbitos nos últimos dez dias. Em 2021 batemos as 62 mortes.
Em quase um ano, 5.483 pessoas foram infectadas. Estado e Prefeitura estimam que pelo menos 340 pacientes ainda estejam com o vírus ativo e, portanto, em tratamento.
A realidade não é menos assustadora quando se fala em internações hospitalares. A secretaria da Saúde do RS (SES) informou hoje que a ocupação de leitos no Hospital Viamão (HV) – seja ou não para tratar doentes com COVID-19 – atingiu absurdos 383.3%. Aos que são mais lentos nas contas, como ocorrem com a maioria dos jornalistas que conheço, isso significa dizer que há quase quatro vezes mais pacientes do que a casa de Saúde tem capacidade de atender com dignidade.
Neste momento em que você lê, tem gente em leitos, em macas nos corredores, na enfermaria e onde mais a criatividade dos profissionais foi capaz de alcançar.
O colapso só não é oficial porque o indicador principal levado em conta pela SES é a ocupação da UTI. O HV tem 25 pacientes em tratamento intensivo – três a menos do que na última semana. Com isso, a ocupação da unidade adulta caiu para 83.3% e agora temos cinco vagas. Contudo, o número de respiradores em uso aumentou: 18 dos 30 equipamentos estão operando – três a mais do que na semana passada.
Casos positivos na Prefeitura
O prefeito confirmou que o secretário de Administração Alfeu Freitas testou positivo para a COVID-19 e está em isolamento. É o quarto caso recente no primeiro escalão da administração: o vice Nilton Magalhães e secretária da Educação Márcia Culau estão em fase final de recuperação.
Lembrando que o secretário de planejamento Nilson Vargas morreu em decorrência do coronavírus no dia 12 de fevereiro.
Alfeu Freitas
Medidas anunciadas
Quadro posto aos leitores, detalho os pontos que Bonatto tornou público nesta tarde:
1. O prefeito quer permitir a telemedicina em Viamão. Já conversou com os vereadores e encaminhou à Câmara projeto de lei permitindo que médicos da rede pública possam atender pacientes por meio de videochamada. Se aprovado, o usuário do SUS poderá ligar para um serviço de teleatendimento que funcionará de segunda a sábado, entre 7h e 19h.
– Isso facilitará o acesso das pessoas, mantendo o distanciamento social. Depois dessa consulta, se for necessário acompanhamento ou exames, o paciente será encaminhado para uma UBS – explicou Bonatto.
2. O projeto enviado ao Legislativo solicita autorização para que o município realize a compra de vacinas contra a COVID-19 para atender toda a população. O prefeito não detalhou valores, mas citou que planeja custear a ação com repasses recebidos para ações contra a pandemia, complementando com recursos do caixa único da Prefeitura.
O Diário de Viamão questionou Bonatto sobre o veto do Presidente da República Jair Bolsonaro ao artigo da lei federal dos consórcios de vacinas que permitia aos estados a livre negociação e compra dos imunizantes. O prefeito diz entender que não há risco para sua estratégia, uma vez que a Justiça já autorizou os entes estaduais a manterem negociações.
3. O tucano anunciou que deseja firmar convênio com o Instituto de Cardiologia, mantenedora do Hospital Viamão, para construção de uma Unidade Básica de Saúde para atender aos pacientes de baixa complexidade. O projeto de lei já também já está na Câmara.
– Isso desafogará o atendimento da emergência, que precisa priorizar o atendimento aos pacientes classificados como média e alta complexidade – defende do chefe do Executivo.
4. Por fim, a Prefeitura fala em compra de novos testes rápidos. Isso daria agildade aos diagnósticos dos pacientes infectados pelo novo coronavírus.
– Testes não faltam, mas embora mais completo, o PCR tem o tempo de coleta e análise pelo Lacen (Estado), o que faz o resultado demorar, por isso o teste rápido ajudará – disse o prefeito, sem dar detalhes sobre prazos, quantidades e valores projetados.
Política
O dia foi movimentado em Viamão. De quebra, Bonatto teve que desmentir os rumores de que o ex-vereador Maninho Fauri, que acaba de deixar o PSD, partido do ex-prefeito André Pacheco, assumiria como secretário da Saúde.
Descontente com as perguntas sobre Fauri, o tucano deixou claro que queria falar sobre COVID-19 e deixar a política de lado.
– Sou secretário e estarei secretário da Saúde nesse momento difícil da pandemia – fechou o mandatário, sem falar em prazos.
Que Maninho Fauri estará no governo, não há dúvidas. Como também está claro que não será no comando da Saúde.
Aguardemos os próximos dias.
Tudo é política, que é a mola propulsora de tudo. Mas como política só existe porque o resto todo existe, faz e não faz sentido falar de política num momento tão sério da crise do coronavírus em Viamão. Acontece que os bastidores do poder local giravam em torno do futuro de Maninho, enquanto o Gabinete do Prefeito costurava os acordos políticos para enviar os três projetos de lei citados neste texto para a Câmara.
Bonatto sabia do burburinho, ouviu a rádio corredor e deixou o telefone sem fio ir adiante. Podia desmentir logo cedo, mas não o fez. Era interessante a ele os olhos de todos voltados a outro lado.
Sem falar de que agora pode incorporar o discurso de que "enquanto estavam resumindo tudo a conchavo político, eu trabalhava pela Saúde de Viamão".
Bonatto gosta desse jogo porque sabe jogá-lo como poucos.