Quando fui te visitar pela última vez, estava chovendo muitíssimo e mesmo assim, senti de passar no mercado ao descer do ônibus, para te comprar flores. Lembro de perscrutar as prateleiras de flores com os olhos, lembro de não gostar de nada, porque estavam feinhas, não tinha nada à tua altura. Mas com relutância, resolvi te levar flores brancas, eram as mais bonitas dali.
Me pergunto se tu sabia, que aquelas eram as últimas flores que eu ia te entregar. Me pergunto se tu sabia que aquela era a nossa última noite juntas, e se sabia que naquele dia iríamos tirar nossa última foto. Com dor eu escrevo, porque descobri que a ausência é uma escola de samba, faz barulho demais, ensaia para chegar, demora para passar… Mas com alegria te vivi, com muita alegria vivi momentos felizes ao teu lado, e o sorriso é o teu símbolo maior.
Um dia tu me contou, que quando eu era criança, tu me perguntou se eu era um peixe que nadava para cima ou para baixo, e eu respondi com convicção que eu era o peixe que nadava para cima. Esse é um dos diálogos mais bonitos e singelos que eu já ouvi, e não me lembraria dele se não fosse por ti, pela tua presença naquele espaço-tempo da minha vida. Quem mais poderia ser, senão nós, se não fossemos nós duas nessa vida, quem seria?
Gosto de pensar como um segredo nosso, quando caminhávamos no sol, e tu me contava sobre os benefícios de uma caminhadinha ao ar livre. Segredo nosso, quando me emprestava pijamas e me aconselhava a não dormir de roupa apertada e nem escura. Segredo nosso, essa nossa despedida, tão sútil e mesmo assim, tão nossa.
Gosto de pensar em nós duas, como pássaros bem soltos no céu, como estrelas brilhantes da noite, como peixes ávidos no mar. Em todas as vidas, eu aprendiz e tu sabedoria . Não me debrucei na tua partida com melancolia de sofrimento, e as minhas formas de oração permanecem sendo outras, são muitas. Mas tu conheceu meu coração, e me ensinou a rezar, por isso tenho esperança nos dias que virão e como um peixe que não desiste, continuarei nadando para cima.