Coluna do Brasil | Triste Dia dos Pais dos 100 mil mortos pelo Coronavírus

Esse domingo (9) deveria ser marcado por comemorações, afinal era Dia dos Pais. Um pai representa justamente aquele que dá a vida a alguém. O progenitor. Mas, infelizmente, não foi a criação da vida o marco desse triste Dia dos Pais de 2020. Pelo contrário, a data marcou um recorde de mortes já que o Brasil ultrapassou as 100 mil vítimas do coronavírus.

Busquei forças para emanar vida em meu olhar, mas não fui ator suficiente sequer para convencer minha filha, de 11 anos. Ela logo percebeu minha apreensão ao zapear pelos diferentes canais de televisão que traziam informações sobre os assustadores números do Brasil diante da guerra contra o Coronavírus. Uma guerra que estamos perdendo feio para o ser microscópico.

Enquanto o inimigo invisível mostra seu perfil mortal, os governantes mostram seu perfil boçal, brigando contra dados e estudos científicos diante da pressão do Capital. Flexibilizações incoerentes, o lockdown nunca realizado, a pouca testagem, a insistência em medicamentos com pouca eficiência e a falta de uma política nacional unificada em relação às ações estratégicas que certamente teriam salvado muitas vidas. Vidas de pais e vidas de filhos.

Olhei para minha filha quando ela me perguntou sobre a volta às aulas. Silenciei, fingindo não ter ouvido sua pergunta. O que eu poderia eu responder? Não poderia dizer para ela aquilo que eu pensei, ou seja, que eu sequer gostaria que ela voltasse. Como pai não poderia ser apenas pessimista. Então tergiversei, “assim que a situação melhorar… quem sabe.”

Quanto risco quando as mortes começam a bater às nossas portas. Quando nomes de nossos conhecidos começam a surgir nas listas de mortos ou infectados parece que a presença da doença em nossos lares é apenas uma questão tempo. Entretanto, nas ruas, as pessoas agem como se retomassem a normalidade de sua vida, aglomerando-se em lojas, correndo risco de morte, para comprar presentes em comemoração àqueles que dão a vida, os pais.

Sem um Ministro da Saúde desde maio, o Brasil não oferece muitas esperanças de melhoras significativas em relação aos dados relativos à pandemia. Fiquei constrangido ao projetar o tipo de mundo que a humanidade está construindo para seus jovens, para seus filhos. Um mundo onde nós somos os estranhos. Invasores sendo combatidos pelos reais donos da Terra, os micro-organismos que não conseguimos superar com nosso grande cérebro e nossa lógica.

Diante dos 100 mil mortos havia poucas opções de celebração de um Dia dos Pais empolgante. Estou entre aqueles que acreditam que ficar em casa é a melhor alternativa e foi o que fiz. Fiquei mais uma vez sem palavras quando minha filha questionou-me a respeito do fim da pandemia. Não poderia tirar dela a esperança de voltar a rever seus amigos e brincar pelas praças, rever seus colegas e parentes. Lembrei de que há vacinas em teste e citei algumas possibilidades. “O hospital São Lucas já testa vacina chinesa”. Mesmo respondendo com seriedade consegui fazê-la sorrir.

Fiz o melhor que pude, convidei-a para ver um filme e comer pipocas. Discretamente tentando mudar de assunto. Senti-me aliviado ao retirar dos telejornais que mais parecem filmes de terror. Logo ela me surpreendeu, parecendo ler meus pensamentos. “Que tal vermos um filme de terror pai?”. “É o que estávamos fazendo querida”, pensei comigo mesmo, cabisbaixo diante da mais purificante inocência infantil.

Mas era dia dos pais. Comemos pipoca, brincamos, dormimos, sonhamos e acordamos. Decidi que sequer gostaria de saber mais sobre os números inimagináveis da “hemorragia interna” brasileira. E quando acidentalmente passei pelos sites informativos me deparei com outra bomba. Dez jogadores do Goiás Esporte Clube testaram positivos para Coronavírus, time da Série A do Brasileirão. A partida foi adiada, mas o Campeonato seguirá. Não trouxe para minha filha essa notícia. Ela merecia não saber. “Feliz Dia dos Pais!”, ela enfim me disse. Só então eu consegui sorrir sinceramente.

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Compartilhe esta notícia:

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

O hippie do aeroporto

Década de 70. Com um violão à tiracolo e uma sacola de lona verde estirada no ombro, lá vinha ele.Figura frequentadora da praia de Ipanema, no Rio de Janeiro. Instigante

Leia mais »

Receba nossa News

Publicidade

Facebook