A 1ª Vara Cível da Comarca de São Leopoldo reconheceu oficialmente a dupla maternidade de um menino nascido em julho de 2023, fruto de inseminação caseira. A decisão, proferida nesta quarta-feira (10), pela juíza Jacqueline Bervian, garante que o nome da mãe não gestante seja incluído na certidão de nascimento da criança, bem como de seus ascendentes, assegurando plenos direitos de filiação.
Com a sentença, o menino passa a ter juridicamente assegurados direitos fundamentais, como identidade, nome, alimentos e herança, além do reconhecimento formal da realidade familiar em que vive.
De acordo com o Provimento nº 149/2023 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o registro de nascimento em casos de reprodução assistida depende de declaração emitida pelo diretor técnico da clínica responsável pelo procedimento. Como a inseminação ocorreu de forma caseira e sem acompanhamento médico, o cartório recusou o registro em nome das duas mães, obrigando o casal a recorrer ao Judiciário.
O Ministério Público deu parecer favorável ao pedido, argumentando que a falta de documento técnico não poderia inviabilizar o reconhecimento da maternidade, sobretudo diante das provas do projeto parental conjunto.
Fundamentação da decisão
Na sentença, a magistrada destacou que o livre planejamento familiar é um direito constitucional, não podendo o Estado restringir a constituição de famílias pela ausência de regulamentação específica sobre inseminação caseira.
“Não é juridicamente adequado que as partes tenham tolhido o seu direito de registrar o nascimento do filho por elas concebido biológica e afetivamente, ainda que por meio de reprodução artificial sem acompanhamento médico, sob pena de lhes ser negada a aplicação e eficácia direta à especial proteção dada à família como base da sociedade, ao direito do livre planejamento familiar e, entre outros, aos princípios da dignidade da pessoa humana, da busca da felicidade e da igualdade”, apontou a juíza.
O caso
Casadas desde 2019, as duas mulheres decidiram constituir família após tentativas frustradas em clínicas de reprodução assistida, barradas por altos custos e questões de saúde. Optaram então pela inseminação caseira, com material de doador anônimo.
Em 19 de julho de 2023, nasceu o menino, mas, ao tentarem realizar o registro com dupla maternidade, foram informadas no cartório de que precisariam de decisão judicial.
Agora, com a sentença favorável, a criança terá assegurado em sua certidão de nascimento o vínculo com ambas as mães, reforçando um precedente importante sobre a proteção da diversidade familiar no Brasil.