Presente involuntário do MEC a reaças e farsa das escolas cívico-militares

Em Zaffa quer manter em Gravataí escola cívico-militar extinta por Lula; Secretária da Educação defende a ‘escola sem brinco e cabelo verde’; Eu, civil de nascença, reputo ‘mina ideológica’ tratei da polêmica. Neste artigo associo-me à análise do jornalista Reinaldo Azevedo em Presente involuntário do MEC a reaças e farsa das escolas cívico-militares.

Sigamos no texto.

Ao anunciar a extinção das escolas cívico-militares, o Ministério da Educação (MEC) resolveu um problemaço dos bolsonaristas: a falta de agenda. Ultimamente, seus valentes vivem de produzir truculência, obscurantismo e misoginia na CPMI do Golpe e na CPI do MST. Quando não é assim, estão prestando contas à PF. Como já destaquei aqui, nada têm a dizer sobre questões realmente relevantes votadas no Congresso, como arcabouço fiscal ou reforma tributária. Quando um dos seus, como Tarcísio de Freitas, govenador de São Paulo (Republicanos), faz a coisa certa, então é linchado pela delinquência do seu próprio campo ideológico. Tarcísio, diga-se, resolveu tirar uma casquinha da decisão do governo e usá-la para fazer as pazes com o bolsonarismo. Já chego lá.

Como se deu essa ajuda involuntária do MEC à extrema-direita e a bolsonaristas em conflito com a sua base? A pasta decidiu pôr fim a uma excrescência inventada por Jair Bolsonaro: o Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares (Pecim). Nota: elas nada têm a ver com os colégios realmente militares, mantidos pelo Ministério da Defesa ou pelas PMS.

Em 2019, Bolsonaro lançou o tal Pecim, que consiste na administração compartilhada de escolas públicas, estaduais ou municipais, entre civis e militares da reserva, sejam egressos das Forças Armadas ou das PMs. Ao todo, há 202 escolas listadas no programa, onde estudam cerca de 120 mil alunos. Há duas modalidades de adesão: 1) a que propriamente emprega os militares (120); b) a que recebe recursos do MEC para implementação própria (82). Na prática, só a primeira realmente está em funcionamento.

Na Saúde, sem dúvida, o bolsonarismo mostrou a sua face mais perversa. Nem preciso elencar os motivos. A Educação vem em seguida na escala da delinquência política, e as figuras exóticas que passaram pelo MEC falam por si. Essa foi a única ideia que o Coiso teve para a área. Insista-se: de verdade, há 120 escolas que teriam um perfil cívico-militar. Escrevo um “teriam” porque, a rigor, o que há de fato é um gigantesco cabidão de empregos para militares da reserva fazerem um bico, atuando como bedéis. Sim, acreditem: a sua função quase sempre se resume a “manter a disciplina” e a dar pitaco aqui e ali na gestão.

Ao todo, o programa emprega 892 militares, com salários que vão de R$ 2.657 — para terceiro-sargento — a R$ 9.152, quando coronel. Os ganhos se somam ao que recebem das respectivas Forças. Fazem um bico nos estabelecimentos de ensino e têm, na média, um salário maior do que o dos professores. A “eficácia” do programa se limita à adoção de uniforme (às vezes), ao perfilamento de estudantes para cantar o Hino Nacional em datas específicas e à cara feia.


Medidas do absurdo


Acontece que essa pantomima custa caro ao MEC: no ano passado, foram R$ 64,2 milhões; neste ano, R$ 86,5 milhões. Dispensável dizer que esse dinheiro merece melhor destino. Só para que se tenha noção do ridículo da “revolução bolsonariana” na educação, há no país em torno de 50 milhões de alunos no ensino básico da rede pública.

Como os militares custarão neste ano R$ 86 milhões para “cuidar” de 120 mil alunos — na prática, menos, porque esse é o número do total de escolas do programa (202), mas só 120 delas contam efetivamente com essa mão-de-obra –, qual seria o custo se o modelo valesse para todos?

Ah, a bagatela de R$ 35,8 bilhões só para pagar a milicada.


Tarcísio e a casquinha


Bastou que o anúncio do MEC fosse tornado público, e Tarcísio de Freitas correu para as redes sociais. Anunciou no Twitter: ”Fui aluno de Colégio Militar e sei da importância de um ensino de qualidade e como é preciso que a escola transmita valores corretos para os nossos jovens. O @governosp vai editar um decreto para regular o seu próprio programa de escolas cívico-militares e ampliar unidades de ensino com este formato em todo o Estado.”

Ele foi aluno, como escreveu de Colégio Militar, não de escolas cívico-militares, que consiste na patacoada de militar da reserva atuar como bedel. Sentiu a oportunidade de refazer as pontes com o bolsonarismo.

Publicou o Estadão:

Após o anúncio do governo federal, a Secretaria de Educação do Estado (Seduc) chegou a dizer às 16h33 que “não faz parte do projeto da atual gestão a expansão das escolas cívico-militares”. Em novo posicionamento, às 19h38, essa informação foi removida para dizer somente que “esse modelo funciona em uma unidade de ensino vinculada à secretaria, em Guarujá” e que “a decisão do MEC de descontinuar o programa não altera o conteúdo pedagógico oferecido aos estudantes”, acrescentou.

Informa Folha:

“Além de São Paulo, os governos do Distrito Federal e do Paraná também anunciaram a manutenção do programa. O governador paranaense, Ratinho Júnior (PSD), seguirá com as 12 escolas ligadas ao Pecim (Programa Nacional das Escolas Cívico-Militares) e outros 194 colégios cívico-militares implantados pelo programa estadual. Já no Distrito Federal, o governador Ibaneis Rocha (MDB) também anunciou que vai manter as 12 unidades de ensino da gestão compartilhada entre a secretaria de Educação e a Secretaria de Segurança Pública, além de quatro outras em parceria com o governo federal.”


Baixa exploração política


Extremistas de direita reagiram imediatamente à decisão:

Senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ): “A política do governo Lula é de revanchismo. A próxima vítima é a escola cívico-militar. Segundo levantamento do próprio MEC (2021), 85% dos gestores relataram redução nas faltas e na evasão e 65% apontaram diminuição nos índices de violência escolar. E o que Lula faz? Encerra um modelo educacional que estava dando certo. Para ele, o que interessa é a DOUTRINAÇÃO IDEOLÓGICA!”

Senador Ciro Nogueira (PP-PI): “O ‘V’ da vingança venceu, mesmo que seja contra alunos inocentes e o lindo futuro que lhes está sendo tomado. Nossa solidariedade aos alunos, às mães e aos pais por esse atentado de um governo que mostra não ser capaz de se libertar dos radicalismos de ideologias contra o povo. Vai passar”.

Senador Rogério Marinho (PL-RN): “Lamentável retrocesso de uma política pública ideológica, que teima em desconhecer os resultados excelentes da educação baseada na disciplina, valores, e conteúdos conectados com a sociedade”.

Também os deputados Gustavo Gayer (PL-GO) e Bia Kicis (PL-DF) protestaram. Daniel Freitas (PL-SC) disse que proporá um PLD (Projeto de Decreto Legislativo) para sustar a medida.

O deputado estadual Rodrigo Lorenzoni (PL-RS) escreveu: “Os indicadores educacionais nas escolas cívico militar (sic) são excelentes. Descontinuar esse programa exitoso, iniciado no governo do presidente @jairbolsonaro, é a prova de que Lula e a esquerda estão dispostos a destruir nosso país através da educação e da economia”.

Quem sai aos seus não degenera. Acha que a economia vai mal… Nota: inexistem os tais “indicadores educacionais” sobre essas escolas.


De volta ao começo


“Reinaldo, fiquei com a impressão, no primeiro parágrafo, de que você achava que a decisão do MEC tinha sido um erro, mas, depois, você desceu o porrete no programa…”

Minhas caras, meus caros, é claro que se trata do programa de remuneração de bedel mais caro da história da humanidade. Seu efeito educacional é nulo. Inexistem recursos públicos para universalizá-lo. Mesmo os Estados que o adotam o fazem apenas em algumas escolas. Então o certo é mesmo o governo federal pôr fim ao troço em sua esfera de competência.

Ocorre que, além do certo, há a hora certa. Num momento em que a extrema-direita zanza pra lá e pra cá, como barata tonta, eu não teria dado a ela a oportunidade de se agarrar a uma causa, a uma palavra de ordem, a uma falsa questão…

Sim, é preciso pôr fim ao programa. Pergunto-me se esse é o melhor momento. Acho que não. Quando menos, era preciso ter conversado mais com a população, deixando claro de que modo a educação e os cofres públicos estão sendo lesados por um capricho estúpido, por um cabidão de empregos. Essa iniciativa de Bolsonaro é um insucesso de público e de crítica entre educadores e junto às camadas progressistas da sociedade. Mas isso não basta. É preciso que mais gente conheça os fatos.

Quanto a Tarcísio, não sei se pretende manter a mesma remuneração aos militares. Ele ainda vai criar o troço. Se o fizer, restará aos professores uma reivindicação: “Quero o mesmo salário de milico da reserva que vira”.

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