Ana D´Avila | Fantasia de uma louca

O analista freudiano viu nela, além da paciente, uma mulher interessante. Mas, naquela manhã de clima lusco-fusco, ela sentiu tanta agonia que não cabia mais nada em sua alma.Nem o elogio. Foi aí que resolveu se distrair.

Numa cidade grande, onde as pessoas afogam as mágoas? Onde elas, mesmo que momentaneamente, ficam felizes?Exato! No Shopping Center.E, por não se julgar interessante, fez um trajeto comum. Num programa de gente comum. Com cartões de crédito de gente comum.

Sua excentricidade, aliada ao jeito simples de viver, chamava a atenção de todo mundo. Não era uma convencida ao ponto de se achar diferente de todo mundo.Distanciando-se rumava, agora, até o templo do consumismo. No shopping tudo era lindo. Como uma grande fantasia.

Mas é necessário ter dinheiro para comprar esta tal felicidade. Que se anuncia nas vitrines. Seus olhos viram sapatos dourados, dignos de  princesa.Celulares inovadores. Cosméticos ultra-modernos. Capaz de exterminar  a mais severa ruga e colocar um brilho de boneca Barbie nos cabelos.

No elevador do shopping lembrou do psiquiatra. Do elogio que ele fez a ela. Excêntrica, eu? Por que razão ele chegou a esta conclusão? Se considerava normal. Tirando as noites de insônia, a leitura dos livros de Niezstche e a mudez, às vezes necessária. Tirando também a fumaça dos incensos de canela que acendia quando sentia energia negativa ao redor.

Agora, dentro do shopping, ela esbarra no café. O nome é “Press”. “Press Café”. Pede um cappuccino com torradas. Senta só. Pede mostarda. A gentileza da atendente a impressiona.E o menu também! Quantos salgados, quantos doces! Alguém pede uma limonada. Outra pessoa, um sorvete. Estranho ter sorvete e limonada num café! Mas pedem.

Depois saciada, faz suas comprinhas: meias de nylon pretas, óculos para o verão e um livro para pensar. Loucura seria não comprar livros.Na segunda-feira, pós shopping, haveria nova sessão com o psiquiatra. Ainda a indagação: não será o turbilhão da cidade com seus bilhões de habitantes e visitantes que  descontrola as pessoas?

Estarão todos  realmente enlouquecendo? Não sei. Perderam a capacidade de um raciocinio lógico. De  julgamento. De fraternidade. Do nem saber mais, onde mora a lucidez. E onde começa a iminente loucura?(Ana D´Avila)

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