Ana D´Avila: Terapia alternativa

Olhou o relógio: meia-noite. No ar, um clima nebuloso. Sua pressão subia a cada pensamento sobre doenças. Era hipocondríaca. De uns tempos para cá, vinha tendo pesadelos. Seu sono já não era o mesmo. Estava hipertensa. Não conseguia dormir em paz. Mesmo embalada por uma musiquinha suave que vinha do rádio da cabeceira.

Viúva, viu seu único filho casar e mudar de País. Estava sozinha. Quase abandonada e nervosa.O cardiologista receitou a ela uns comprimidos continuados.Não gostou disto. Imaginando que até a sua morte teria gastos e compromissos com os tais comprimidos. Mas tomava. Não desrespeitava as receitas médicas.

Circulando pela farmácia ouviu duas outras senhoras conversando. "Pois é, Cristina, o sono dela só voltou a ficar tranquilo depois que ela tomou as gotinhas". Curiosa, quis saber que gotinhas eram essas que inebriavam e faziam dormir. Perguntou a farmacêutica. Uma menina bem nova e com aspecto de sabida. "Elas tomam florais". Continuou: "São gotinhas leves, de tratamento longo, mas de grande efeito", respondeu a menina.

A farmacêutica deveria ter uns vinte e poucos anos. Morena e com os cabelos presos num rabo de cavalo.Foi até a prateleira e trouxe dois vidrinhos dos tais florais. A senhora pagou o remédio e desapareceu na imensidão da avenida. Onde sediava um movimentado comércio. Hoje, restrito e cheio de cuidados. Em todos os balcões havia álcool gel para os fregueses. E, muito espaço destas lojas, comercializando máscaras. Cirúrgicas, de florzinhas, pretas e brancas na maior diversidade.

No outro dia, novamente, uma olhada no relógio. Desta vez, 11:11. Um horário que ela respeitava por acreditar em portais. E saber que este tinha um significado. Esotéricos falavam dele com muita frequência e atenção. Curioso é que sempre que tomaria alguma decisão importante em sua vida, lá estava o registro: 11:11. Abriu a caixinha do floral e esperou a meia-noite. Hora em que rotineiramente procurava dormir.

Buscou um copo na cozinha despejando nele, quatro gotinhas do floral. Num só gole, empurrou garganta a dentro. Ajeitou o travesseiro e foi se encostando de leve em sua cama. Pensou na vida. No outro dia. No que teria que comprar no supermercado. E, principalmente, como estaria seu filho em terras estrangeiras.

Num passe de mágica, adormeceu. Se foi a eficiência das gotinhas, não se sabe. Mas como hipocondríaca de carteirinha, sempre acreditou que para todo problema de saúde que  por ventura tivesse, encontraria um remédio. Uma solução. Como surgia em sua frente, quase sempre, aquele código 11:11. Dormiu como  um anjo. Sem pesadelos e na certeza de ter resolvido a insônia. Bem cedinho e disposta preparou seu desjejum. Comeu fruta, pão torrado e uma deliciosa taça de café com leite.

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