Se é bom morar no Brasil, é! Mas este bom bate de frente com a esculhambação. O compositor Tom Jobim sintetizou, certa feita, este pensamento, com a frase:”Viver no exterior é bom, mas é uma merda. Viver no Brasil é uma merda, mas é bom”.
Não é possível ser certinho e honesto num país que não te respeita, onde as leis não são cumpridas e onde o “levar vantagem” se instalou definitivamente como cultura nacional.
Quando perguntaram ao Tom Jobim porque ele sempre voltava ao Brasil, quando poderia viver sossegado nos Estados Unidos ele respondeu:
— Para me aporrinhar. Volto porque nunca saí daqui.
Dona Maria Alice é uma destas brasileiras. Saiu do Brasil, mas acabou voltando. Talvez tenha cansado da seriedade da Europa. Da cultura sofisticada, e sentido muita saudade dos amigos, da família, do samba e do guaraná.
De volta ao Brasil e instalada em Porto Alegre, questiona sua volta. Principalmente agora que, com a greve dos bancos, sentiu a dificuldade de pagar contas e de interagir com a economia. A sua economia.
Com o boleto bancário em mãos tentou ser honesta e pagar, no banco, no dia do vencimento, o aluguel do apartamento onde mora. Nada feito.
Os bancos encontram-se de portas cerradas a quase um mês. Ou quase. Pensou nos caixas eletrônicos,mas em seu bairro estes equipamentos foram detonados por explosivos num assalto que abalou toda a vizinhança.
Ligou para a imobiliária para pedir uma ajuda. O atendente sugeriu que ela fosse à uma agência do Correio. Ela foi. Mas o Correio não estava recebendo aluguel de ninguém.
Maria Alice teve nova ideia: a lotérica do outro lado da rua. Mas a lotérica só recebia pagamento com valores menores. Neste momento, ela sentiu saudades da Europa. Do respeito pelo cidadão. Refletia, refletia e, desolada e cansada, desistiu de pagar o aluguel.
Até que, pela quarta vez, ligou para a Imobiliária e pediu socorro.
— Se eu não pagar o aluguel hoje, amanhã terei que pagar multa. Não é culpa minha. É a greve dos bancos.
A atendente da imobiliária mandou-a procurar a matriz, no centro da cidade. Ela foi. Depois de subir e descer escadas. De esperar e de reclamar, ela conseguiu finalmente pagar o aluguel.
Mas já não está tão certa se vale a pena ficar por aqui. Sambando e bebendo guaraná.
E pensou muito na frase do Tom Jobim.