Lembro de um professor meu comentando sobre ter lido uma coletânea intitulada “As cem melhores crônicas de todos os tempos” e não ter gostado muito. Para ele, o problema desse tipo de texto é que envelhece. Pode fazer muito sentido naquele dia, naquela semana e talvez naquele mês, mas alguns anos após ser escrita, a crônica tem grandes chances de perder sua relevância, seu impacto. Entendo muito bem isso. Sou um leitor assíduo desta modalidade de literatura e não é nem um pouco difícil perceber cronistas tratando de temas em voga nas discussões do momento.
Eu sempre mantenho no meu pensamento este comentário do meu antigo mestre enquanto escrevo as minhas. Embora tente trazer algo de atual, também busco deixar alguma mensagem com a qual os leitores possam se relacionar em qualquer tempo, afinal, se a ideia toda por trás da escrita é eternizar-se, apesar desta crônica ser sobre o ano que passou, vou tentar fazer aqui uma análise com sentido tanto para quem viveu este período, quanto para as gerações futuras. Antes de avançar, preciso fazer uma ressalva. Comentei sobre escrevermos com a intenção de nos eternizarmos, mas, na verdade, tenho certeza absoluta que qualquer tentativa de eternidade é uma tentativa frustrada.
Porque nada é eterno. Como já tratei em outros textos, por exemplo, sobre não termos tempo, porque tempo não é uma coisa sobre a qual podemos deter a posse, entendo a criação literária mais como um exercício de introspecção. O que nos traz de volta ao assunto desta crônica, porque este ano, mais do que qualquer outro, serviu bastante para isso. Para conhecermos a nós mesmos. Então, após três parágrafos, consegui chegar onde queria, refletir como este ano me afetou para, colocando no papel (ou no monitor), entender melhor meus sentimentos sobre ele.
A primeira sensação sobre os últimos doze meses é estranha para mim, porque muitos projetos deixaram de acontecer, fazendo este período parecer ter levado o dobro do tempo para passar, mas também foram tantos outros acontecimentos acumulados que ele pareceu ter passado voando. Gosto de brincar e usar como metáfora para este ano o mês de agosto. Ele costuma se arrastar no calendário, aparentando ter quarenta e cinco dias, mas desta vez teve apenas duas semanas, que me envelheceram o equivalente a um ano inteiro.
Confesso ser confuso este meu início de análise, contudo considero adequado haver confusão quando o tema é um ano pandêmico. Agora, deixando a parte onde há muitas dúvidas de lado, sobre um ponto tenho certeza em relação a 2020, discordo na íntegra de quem brincou que não iria contabilizar seu aniversário porque, como não pode usá-lo, considera que este ano não aconteceu. Sério? Não aconteceu? Pessoas foram demitidas, arranjaram novo empregos e foram demitidas de novo. Muitos perderam seus negócios. Já outros, enxergaram oportunidades onde ninguém mais viu e lucraram com a pandemia. Alguns casais se separaram e outros se formaram. Pessoas perderam seus entes queridos e perderam a vida. Este foi um dos anos que mais aconteceu.
Apesar disso tudo, igual a todos os outros, este ano também passará. E pior, nós vamos piscar e vai ter passado um ano do seu término, depois dois, depois uma década e depois um século e ninguém mais vai mencioná-lo a não ser os livros de História. Da mesma forma que esta crônica, 2020 também vai envelhecer, junto com todas as suas experiências e aprendizados. Lições como quanto o distanciamento social nos prejudica pela saudade e como o confinamento desgasta relações, ficarão no passado. Só espero que eu não esqueça do meu maior ensinamento deste ano, que companhias boas são raras, devem ser valorizadas e não podem ser sufocadas.