Mudanças no Ministério da Justiça e PF seguem indefinidas

Jair Bolsonaro | Foto WILSON DIAS | Agência Brasil

Desde o pedido de demissão do então ministro da Justiça Sérgio Moro, na sexta-feira (24), o presidente Bolsonaro segue, até às 19h dessa segunda-feira, sem definir oficialmente o novo nome para o cargo. Nos bastidores, porém, já é dada como certa a escolha pelo atual ministro da Secretaria-Geral da presidência, Jorge Oliveira, mas ele próprio relatou preocupação com a decisão por ser amigo pessoal da família Bolsonaro.

Entretanto, a substituição que causa mais dor de cabeça a Bolsonaro diz respeito ao comando da Polícia Federal. A mudança, que culminou na traumática saída de Moro, está cercada de incertezas e acusações. Moro, ao deixar o cargo na Justiça, destacou que a informação trazida no Diário Oficial do mesmo dia, tratando da demissão do então Comandante da PF Maurício Valeixo "a pedido" era inverídica. Na verdade ele teria sido exonerado a pedido do presidente.

Moro deixou claro em seu discurso de despedida do governo, na sexta-feira, que o real objetivo do presidente da República é interferir em investigações sigilosas da PF, principalmente naquelas que apresentam ameaças a seus filhos. O vereador Carlos Bolsonaro, por exemplo, é investigado como mentor do esquema de fake news para atacar ministros do Supremo Tribunal Federal e deputados da oposição.

Diante do bombástico pronunciamento, a indicação natural de Bolsonaro para o cargo, o delegado Alexandre Ramagem, atual diretor-geral Agência Brasileira de Inteligência, gerou desconfiança nos demais setores do legislativo. Ramagem, como Oliveira, é amigo íntimo de Bolsonaro e chefiou em 2018 sua equipe de segurança durante a campanha eleitoral. Além disso, circulam fotos na internet de Ramagem participando de festas com Carlos. Imagens postadas pelo próprio vereador.

"A partir do segundo semestre do ano passado passou a haver uma insistência do presidente na troca do comando da Polícia Federal", destacou. "Não é aceitável essas indicações políticas. Não aconteceu  na Lava Jato, a despeito de todos os problemas de corrupção dos governos anteriores", completou.

Moro não poupou palavras para ressaltar a intenção objetiva de Bolsonaro de interferir no trabalho da PF de forma pessoal. "O presidente me disse, mais de uma vez, expressamente, que ele queria ter uma pessoa com o direto contato dele, que ele pudesse colher informações, colher relatórios de inteligência". Os questionamentos seguiram de forma contundente. "O grande problema não é quem entra, mas por que alguém entra. E se esse alguém, aceitando a substituição, com o impacto que isso vai ter na corporação, não conseguiu dizer não para o presidente a uma proposta dessa espécie, fico na dúvida se vai conseguir dizer não em relação a outros temas. Para mim esse ultimato é a sinalização de que o presidente realmente me quer fora do cargo ", concluiu.  

 

Bolsonaro acusa Moro de exigir cargo no STF

"Hoje vocês conhecerão aquela pessoa que tem compromisso consigo próprio e não com o Brasil". Assim começou o pronunciamento do presidente Jair Bolsonaro no mesmo dia do pedido de demissão de Moro. Ele não tardou em rebater as acusações, mas admitiu a possibilidade de interferência na PF. "Oras bolas, se eu posso trocar o ministro, por que não posso, de acordo com a lei, trocar o diretor da Polícia Federal?", questionou.

Bolsonaro acusou Moro de não estar preocupado com a substituição na PF, mas sim com um possível favorecimento para que ocupasse uma vaga no Supremo Tribunal Federal. "Você pode trocar sim, mas depois de novembro, depois que o senhor me indicar para o STF", declarou presidente sobre possível diálogo com Moro.

Sobre o pedido de exoneração de Valeixo, Bolsonaro replicou. "Ele está cansado. Está fazendo como pode seu trabalho. Não tenho nada pessoalmente contra ele. Então falei que o diário oficial publicaria a exoneração do Sr. Valeixo. E, ao que tudo indicava, uma exoneração a pedido", completou. Moro negou que o diretor tivesse intenção de deixar o cargo.

Bolsonaro fez questão de minimizar tanto seu contato pessoal como a importância do antigo ministro em sua campanha eleitoral. "Primeiro contato que tive com ele ocorreu no aeroporto de Brasília em uma lanchonete. Ele praticamente me ignorou. Confesso que fiquei triste, ele era um ídolo para mim", relatou.

O presidente revelou que, posteriormente, Moro entrou em contato por meio de outra pessoa para marcar uma visita ao então candidato que se recuperava do atentado a faca, mas que declinou. "Ele não esteve comigo durante a campanha. Evitei conversar com ele naquele momento, entre o primeiro e o segundo turno, porque essa visita se tornaria pública e eu não queria aproveitar do prestígio dele", ressaltou.

Sobre a "carta branca" cobrada por Moro em seu discurso, Bolsonaro se explicou dizendo que "autonomia não é sinônimo de soberania" e que destacou que teria poder de veto quando de indicações de cargos considerados estratégicos.

Bolsonaro mais uma vez, diante da crise, voltou a atacar a imprensa alegando "falta de isenção". "Desde o início, se começou a falar que eu estava dificultando operações de combate à corrupção. As grandes operações da PF no passado eram em cima de estatais ou empreiteiros que e arrancavam recursos via bancos oficiais. Colocamos um ponto final nisso. Poderosos se levantaram contra mim. Estou lutando contra um sistema", explicou.

Bolsonaro declarou que precisou "implorar" pela averiguação de quem teria mandado matá-lo, mas que a PF estava muito mais preocupada em determinar quem foi o assassino da deputada Marielle Franco. "Cobrei muito dele sobre isso. Acredito que a vida do presidente da República tem um significado, afinal de contas é um chefe de estado. Isso é interferir da PF?" concluiu.

 

Problemas à vista para Bolsonaro

A sequência dos fatos mostra um caminho pedregoso para Bolsonaro, em momento de relativo isolamento político. Tendo em vista melhorar sua base no Congresso Nacional, o presidente trabalhava em uma articulação política com os partidos chamados do "Centrão" quando foi surpreendido com o pedido de demissão de Moro. Já é conhecido que o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, tem na gaveta diversos pedidos de impeachment.

Ainda na acidentada sexta-feira, a Associação Brasileira e de Imprensa (ABI) comunicou que também ingressou com pedido de impeachment contra o chefe do Executivo. Em vídeo, o presidente da instituição, Paulo Jeronimo de Sousa, justificou a representação "Tendo em vista os sucessivos crimes de responsabilidade cometidos por ele, assim como os graves atentados à saúde pública". Para a ABI, as acusações de Moro caracterizam a intenção do presidente de usar a Polícia Federal para seus interesses pessoais.

 

Luta para permanecer em pé

Mas os problemas não param por aí.  Partidos de esquerda e de direita estão tentando barrar as futuras nomeações de Bolsonaro para a PF e para o Ministério da Justiça. A luta para não sofrer o nocaute promete ser intensa.

"Jab de esquerda": o vice-líder do PSOL na Câmara, deputado Marcelo Freixo, já adiantou desde o final de semana que irá protocolar documento na Justiça Federal assim que for confirmada a nomeação de Alexandre Ramagem para o cargo de diretor-geral da PF.

"Direto de direita": o MBL (Movimento Brasil Livre), em documento, declarou que Bolsonaro teve intenção de utilizar o cargo para fins pessoais. Como se não bastasse, os antigos apoiadores apresentaram na segunda-feira, mais um pedido de impeachment. "Já de algum tempo o presidente tem sinalizado não ter compromisso com o combate a corrupção, mas tem compromisso em blindar a própria família", afirmou deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP). Para Kataguiri, as promessas de Bolsonaro devem ser consideradas "estelionato eleitoral".  

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