Recomendamos o artigo do economista André Roncaglia, publicado em sua coluna na Folha de S. Paulo
A arrogância do poder permite sinceridades que a alma tentaria esconder. Em entrevista ao programa Roda Viva na segunda-feira (13), Roberto Campos Netopresidente da BC (Banco Central), apresentou a “agenda social” do banco. Ele não falou sobre Emprego ou Renda. Falar de pix.
Ele disse que um menino veio lhe vender um “produtozinho”. Quando disse que não tinha dinheiro, a criança disse: faça um Pix. Surpreso, ouviu do menino que o sistema de pagamento havia mudado sua vida. Orgulhoso, ele sentiu que havia impactado a vida das pessoas.
No dia seguinte, o Unicef mostrou que 32 milhões de crianças e adolescentes brasileiros vivem na pobrezaresultado da pandemia e da desastrosa ausência de política social de Bolsonaro e Guedes.
Pix apostilas digitalizadas e trabalho infantil. No mundo interconectado, a pobreza digitalizada está um passo acima da pobreza analógica. A cidadania no mundo capitalista só pode ser acessada com dinheiro. Chamá-lo de agenda social revela o que Campos Neto tentou esconder: seu apego espiritual ao neoliberalismo implacável do Governo Bolsonaro. Vamos ver.
Quando o presidente do BC falou sobre as causas da Inflação, lembrou-se apenas das expectativas implícitas na curva de juros. É por meio dele que Faria Lima informa à autoridade monetária se suas expectativas estão ancoradas ou não. Se não estiverem, a Selic (taxa básica de juros) tem que ficar lá em cima.
O relatório trimestral de Inflação do BC aponta outras causas: choques nos custos de energia e alimentação (PPI da Petrobras e gu3rr4 da Ucrânia), deslocamentos da demanda promovidos pela pandemia e indexação generalizada que autonomiza o repasse de Preços. Tudo isso mantém a Inflação resistente à queda.
As altas taxas de juros não atacam essas causas, mas reduzem a atividade no restante da economia, segurando os demais Preços. Em vez de investir em produtividade, as empresas defendem seus lucros espremendo a Renda dos trabalhadores. O efeito é a destruição de empregos.
A Política monetária apertada mina o poder de barganha dos trabalhadores, como sugerido por artigo publicado por federal (Federal Reserve, o banco central dos EUA). Apoiada na reforma trabalhista de 2017, a precarização do trabalho doma a ousadia do trabalhador, motivando-o a aceitar qualquer salário para ter um Emprego.
Campos Neto destacou que o Desemprego está abaixo do nível pré-pandemia, só esqueceu de falar da qualidade das ocupações.
Relatório Ipea mostra que a queda recente do Desemprego decorre da retração da força de trabalho. Traduzindo: o trabalhador demitido pode escolher entre a precariedade do setor informal e tornar-se um microempreendedor; talvez ambos, se você for muito dedicado.
É aí que entra a ação social do BC —via microcrédito e financiamento aberto— ajudando a pejotização dos trabalhadores. Tem mais: segundo Campos Neto, o BC pensou na educação financeira dos pobres (para dar valor ao dinheiro) e dos autônomos.
Pausa para desabafar. Não conheço um rico que valorize tanto o dinheiro quanto um pobre. Quem deve fazer aula de educação financeira é a massa de ricos endividados até os dentes e sonegando impostos. Ser rico sem pagar suas contas é fácil. O heroísmo chega ao final do mês com a Renda média brasileira. Fim do intervalo.
Até 2022, oito em cada dezGoverno-31jan2023.pdf” rel=”nofollow” target=”_blank”> empregos formais eram de baixo qualificação. A Selic no patamar atual inviabiliza qualquer política industrial consistente, que integre a formação da mão de obra ao desenvolvimento da Indústria e Serviços sofisticados.
O presidente do Banco Central precisa assumir o objetivo de promover o pleno Emprego, conforme previsto na lei complementar 179/2021, e mobilizar o Copom para reduzir gradativamente a Taxa de juros.
Para ser o banqueiro central dos pobres, ele deve priorizar a geração de empregos e moderar os retornos financeiros de Faria Lima. A verdadeira compaixão é uma árvore com raízes amargas, mas frutos doces.
Bom carnaval a todos!