A eleição mais disputada da história de Viamão é também a eleição da vergonha

Imagem: Reprodução TV Globo

Poderia ser qualquer um o primeiro colocado, e minha análise seria a mesma. Não se trata de quem venceu a disputa, mas de como ela se deu. Os 320 votos que separaram Valdir Bonatto e Guto Lopes na briga pela cadeira de prefeito de Viamão indicam com clareza o que foi o processo eleitoral. A Velha Capital não é uma ilha e por isso experimentou os ecos de um fenôneno nacional: a falta de interesse no pleito, o descrédito da classe política e a exaltação da intolerância religiosa e social polarizaram debates e interferiram no resultado das urnas aqui e Brasil afora.

O efeito prático dessa colcha de retalhos formada pela junção de tais fatores é uma das piores abstenções já vistas. Ao todo, 41.481 pessoas deixaram de comparecer em suas seções para votar em 2020. Isso é 26,62% do eleitorado local. Em termos de comparação, é quase igual à soma dos votos dados aos candidatos que ficaram entre a terceira e a sétima colocação (45.218). 
Em 2016, no outro pleito municipal, a ausência foi de apenas 7,38%. Mas não culpem a pandemia pelo fracasso do domingo, o povo não deixa nem de tomar sorvete na praça, ou seja, se quisesse votar, o eleitor local teria ido.

Dentro do universo dos que foram exercer seu direto frente a urna (114.335 pessoas), 10,12% de votos brancos (11.577) e 8,70% de nulos (9.946). Convenhamos, 21.523 votos mudam qualquer eleição. Bota no cálculo os 41,4 mil que abriram mão do voto, e a conta fica em 63 mil – deixando qualquer dirigente partidário de cabelo em pé. É uma matemática clara e conhecida, mas então por que diabos não conseguem virar o jogo?

Com medo, primeiro as legendas passaram a tirar a palavra partido do nome. Depois deram vez a figuras pouco iluminadas que se dizem apolíticas e que na maior parte dos casos fazem um discurso moralizador meramente ilusório. Nesse ano, os marqueteiros deram um jeito de sumir com siglas, cores tradicionais e até com nomes. Na Capital, Valter Naglestein era só Valter, na tentativa de esconder um passado político e parecer novo. Em Viamão, quem tentou encontrar o partido na bandeira da maioria dos candidatos se deu mal. Aliás, na história eleitoral da Terra das Figueiras já teve até candidato que mudou a grafia do nome no material de campanha.

Essa vergonha de fazer política está matando a política. Enquanto partidos ocultam suas identidades – e a mim parece que alguns nunca tiveram mesmo – deveriam estar preocupados em mudar o que o eleitor de fato não gosta. Quase ninguém mais tem paciência para santinhos na porta da seção eleitoral e bandeiraços que atrapalham o trânsito. O tal carro de som produz irritação decibélica, e a sujeira na caixa de correio desgosta até quem tem consciência sobre a importância do processo eleitoral. E eu nem estou falando das promessas irrealizáveis e dos discursos padronizados, feito futebolista profissional em entrevista de beira de campo.

É hora de a política sair do armário, de assumir para que serve, gerar sensação de pertencimento, produzir resultado positivo. Defender cores, escudos e propósitos claros é obrigação, pode desembaralhar a cabeça do eleitor anos, até mesmo décadas antes de uma eleição.

A questão é que quase a totalidade das legendas só pensam no poder pelo poder, e os candidatos pulam de uma para outra a cada pleito. Meses antes, anunciam "desavenças irreconciliáveis", pulam dos governos e se apresentam como "homens de Deus e da família", "a cara da mudança", e mal sai o extrato de urna, já estão negociando composição de maioria na Câmara e CCs na gestão eleita.

Aí não dá nem para culpar o eleitor quando ele não vota ou diz que político é tudo igual.

 

Números do domingo em Viamão
 

Prof. Valdir Bonatto (PSDB) – 25,81% – 23.957 votos

Guto Lopes (PDT) – 25,47% – 23.637 votos

Maninho Fauri (PSD) – 21,15% – 19.626 votos

Capitão Martim (PRTB) – 15,81% – 14.670 votos

Nadim (PSL) – 9,57% – 8.878 votos

Adriano Ricoldi (PSOL) – 1,62% – 1.507 votos

Paulo do Sopão (AVANTE) – 0,58% – 537 votos

 

 

 

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