A sina de escrever

Certa feita, indaguei: Por que escrevo? Pois às vezes parece uma forma de sofrimento. Serei masoquista? Mas escrever é uma forma de comunicação. No dia desta inquietação, nasceu um poema. “Escrevo para expressar-me. Para passar as horas, que não passam. Para iludir-me (sensação de poder). Para envaidecer-me. Para concatenar ideias. Escrevo querendo parar de sofrer, entendendo que escrever também pode ser terapia. Talvez melancolia. Como um dia sem sol. Uma nuvem correndo para um ponto ermo no céu. Nesta abrangência cósmica, divina, secreta ,incomensurável. Mas apesar de tudo. Escrevo para confundir-me. Já que meus passos atropelam a vida. E eu? Sempre paro nestes cafés de toalhas lindas. Rabisco guardanapos. E, escrevo”.

Tudo estava ali. Como se a sina estivesse escrita nas estrelas. Aos sete anos de idade já havia decidido. Minha vida seria dedicada à escrita. Dos cinco aos dezoito anos escrevi muitos poemas. Um dia num ataque de fúria, de arrependimento ou de mediocridade, encinerei-os numa grande fogueira no fundo do pátio, na casa onde morava com meus pais. Aos olhos atônitos da minha mãe, que gritava: “Não faça isto guria. Teus escritos devem ser guardados e não queimados”.

Não houve mais tempo de salvá-los. Nem eu queria. Desejava era me livrar deles. Meus segredos eram só meus. Meus fantasmas interiores também. Na época não queria divulgá-los para ninguém. Hoje vejo que errei. Não deveria ter feito uma fogueira de um provável livro. Mesmo que aos meus olhos, ele não fosse uma grande obra literária.

E a vida me levou à Universidade. Curso de Jornalismo. Mas eu queria escrever muito. E o Jornalismo às vezes nos limita. No estágio da televisão senti esta limitação. A gente escreve muito e o editor, escolhe só um parágrafo  para descrever a reportagem. Achava que não poderia trabalhar no Jornalismo de televisão. Pelo menos na área dos jornais, não. Não desejava ver meus textos podados. Em virtude de tempo, importância, política ou sei lá o quê. E, além de tudo meu gênio fugidio, se manifestava a toda hora. Fugi da redação da TV.

Agora, na idade adulta. Eu diria, mais que adulta, tenho oportunidade de escrever bastante. O que me sacia, dá asas à minha imaginação, me faz feliz. Como apregoa Frei Betto em sua obra sobre o ofício de escrever. Diz ele:”Bartheanamente escrevo para ter prazer. Sabor do saber. Tecer textos.Tanto que, uma vez publicado, o texto já não me pertence.

É como um filho que atingiu a maturidade e saiu de casa. Já não tenho domínio sobre ele. Ao contrário, são os leitores que passam a ter domínio sobre o autor e sua obra.Nesse sentido, toda escritura é uma oblação, algo que se oferta aos outros. Oferenda narcísica de quem busca superar a devastação da morte. O texto eterniza o autor. Escrevo também para sublimar minha pulsão e dar forma e voz à babel que me povoa interiormente. A literatura é o avesso da psicanálise. Quem ocupa o divã é o escritor, que convida o leitor a ser seu analista.”

 

 

 

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