Há um recado na decisão de Alexandre de Moraes de manter sob investigação apenas dois dos oito tios do zap flagrados, em agosto do ano passado, trocando mensagens pró-golpe.
O ministro informa, um ano depois da abertura do inquérito, que está apartando do grupo os desimportantes, para ficar só com os que interessam.
Seis não teriam cometido crime e tampouco têm relevância para a compreensão do que faziam antes da eleição, quando alguns deles assumiam posições golpistas explícitas.
Dois continuam sob os seus cuidados. São os empresários multimilionários Luciano Hang, o autoproclamado véio da Havan, e Meyer Nigri, da Tecnisa.
E esses são os que estão livres da acusação de que tramavam um golpe, se Lula fosse eleito: José Isaac Peres (Multiplan), Ivan Wrobel (W3 Engenharia), José Koury (Barra World Shopping), André Tissot (Grupo Sierra), Marco Aurélio Raimundo (Mormaii) e Afrânio Bandeira (Coco Bambu).
Por que só dois continuam de castigo? Porque a Polícia Federal confirmou em relatório a Moraes que Nigri entregou a senha de um celular apreendido em batida na casa dele.
E que a partir daí a polícia descobriu que ele reproduzia mensagens golpistas e fake news vindas diretamente de um celular de Bolsonaro.
Luciano Hang fica no inquérito porque, nesse caso, é um arquivo a ser aberto. Teve um celular apreendido, mas não deu a senha. Se não colaborou, continua sob investigação.
É interessante que Moraes tenha feito essa apartação a dois dias do aniversário da operação de busca e apreensão contra o grupo de tios ricaços, no dia 23 de agosto de 2022. Lula tinha 47% das intenções de voto, e Bolsonaro, 32%, segundo o Datafolha
Desde então, todos ficaram de fora das redes sociais. O que foi uma punição de Moraes, ao tirá-los da exposição e da militância na internet, pode ter sido uma trava salvadora.
O ministro tirou do ar oito bolsonaristas poderosos, dois meses antes da eleição, e pode ter evitado complicações maiores para o grupo.
O sinal dado agora é este: Hang e Nigri continuam na panela e podem estar saindo do cozimento morno e entrando em fogo alto.
Pode ter chegado ao fim o purgatório que manteve os dois sob vigília, mas sem avanços aparentes, durante um ano.
Hang já havia sofrido busca e apreensão no inquérito aberto em abril de 2019, também sob os cuidados de Moraes e que engloba fake news, atos antidemocráticos, gabinete do ódio e milícias digitais.
E está na lista dos 79 nomes do relatório da CPI da Pandemia, enviada ao Ministério Público, como suspeito de participação no gabinete paralelo do Ministério da Saúde.
O empresário defendia o tratamento precoce e ao mesmo tempo participava de um grupo de amigos que tentava comprar a vacina para as suas empresas. É citado no relatório sob a acusação de incitação ao crime.
Ele e todos os outros 78 da lista estão livres de indiciamento até hoje. A entrega do relatório completa dois anos em setembro. Todos estão impunes.
A dispensa do grupo de tios do zap que agora se vê livre de Moraes, e do qual restam apenas dois ainda investigáveis, reforça o cenário que prevalece até o momento.
O sistema de Justiça ainda não alcançou os manezões, em meio à abertura de centenas de processos contra manezinhos.
Se os dois que restam também escaparem mais adiante, estaremos todos constrangidos diante de uma constatação terrível para a autoestima da democracia.
Se isso acontecer, no segmento desse e de outros agrupamentos de ativistas civis golpistas, terá sobrado só para os manezinhos do 8 de janeiro e para empresários de uma linha intermediária.
Sabe-se muito bem o poder de destruição da eventual impunidade de manezões endinheirados que ajudaram a articular, financiar e operar o golpe.