Ana D´Avila | A espingarda

Em meio às atuais discussões sobre armas, munições e defesas, recordo minha saudosa Vozinha. Ela tinha uma espingarda. Vivia num sítio lá em Morungava, distrito da cidade de Taquara. Por que ela usava arma? Para se defender, suponho.

Os inimigos eram muitos. Desde bandoleiros, desconhecidos que apareciam na localidade, até bichos do mato que à noite amedrontavam. Não só minha Vó, como todos  que viviam com ela. Às vezes, todos viajavam. Ela ficava sozinha, contemplando a escuridão com sua arma. Acho que a segurança dela vinha do porte da espingarda. Não havia luz elétrica. Só candeeiros. À noite era um imenso breu.

Durante a semana ela se ocupava das tarefas rurais. Entre elas, o cuidado com sua horta.Plantava legumes e algumas ervas aromáticas. O manjericão se destacava quando ventava.Que sacudia suas folhas e espalhava no ar  um delicioso perfume .Minha Vó, apesar da seriedade de sua arma, era uma mulher mística.

Tinha um pequeno tarô. Era fervorosa em Deus e fazia previsões bastante certeiras. Benzia também. Suas rezas para Santa Luzia e Santa Bárbara eram frequentemente interpretadas. As vizinhas de outros sítios a procuravam para estas benzeduras. Que servia tanto para curar olho-grande em crianças como para enfermidades em animais de estimação.

Minha Vó tinha uma gata chamada “Bilila”. Era sua companheira. A gata emitia uns “mios”que lembrava um idioma. Era a comunicação entre elas. Quando fazia seus benzimentos, a gata a acompanhava. Os benzimentos eram feitos com arruda e sempre ao ar livre.

A fama de benzedeira atravessava toda a região. Ela respeitava a natureza. Entendia como ninguém,os fenômenos climáticos. Olhava para o céu ao entardecer e sabia exatamente como seria o próximo dia. Se choveria,se faria sol ou se haveria geada.

Minha Vó materna tinha descendência francesa. De estatura mignon, adorava pratos à base de caça.Muitos miúdos de galinha e também passarinhos. Nestas horas, acho que a espingarda servia também para abater os pássaros. Naquela época, a natureza era mais generosa e não havia preocupação com a extinção de animais. Minha Vó faleceu aos 73 anos de idade, de morte súbita.

A espingarda dela era guardada num galpão. Não dentro de casa. Ela tinha muitos netos e acho que esta medida, era para proteger as crianças, de um possível acidente. Eu, de minha parte, tinha receio da arma. Jamais quiz segurá-la. Ou tentar usar. Também não lembro de sua marca.Acho que funcionava com chumbinhos. Nunca escutei seu estampido. Mas sei que era eficiente.

Hoje, e por ser militar, nosso presidente Jair Bolsonaro, usa uma arma. Lembrei da minha única referência armamentícia: a espingarda da minha vó e também o nome da cachorra do atual Presidente: “Bereta”. Em outros tempos, ali por volta de 1961, também o gauchíssimo ex-governador Leonel Brizola portou uma arma. Uma metralhadora, da indústria nacional (INA). Para defesa do Palácio Piratini durante o episódio da Legalidade.(Ana D´Avila)

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