Por que o sono não vinha? Por que, de repente, o mundo parou? Ou acelerou. E o processo da vida se fundia com pensamentos que nem eram mais seus. Na intranquilidade de uma noite azeda. Na tempestade ida e na vontade de se dar. Prazer, agonia. Até entender-se “cafona”.
Tudo estava bem, mas não ao ponto da felicidade. Faltava algo. Faltava momentos. E aquele desejo enorme de voltar a vê-la. Ele era um homem sensível e estava apaixonado.
Mas, onde andaria ela às cinco horas da manhã? Carregando a bateria do celular? Colocando Nescafé em sua caneca preferida? Ou curtindo um resto de noite .Talvez deitada e triste em seu leito apocalíptico. Inteiramente só. Mesmo dividindo a cama.
Ah… o amor. Ah… os desejos. Ah… os pensamentos que vão reconstruindo a noite. No Brasil, só cumplicidades e falcatruas. E a eterna cafonice! Na TV, notícias ruins. Honestidade e ética indo pelo ralo. Imundo. De ratos e detritos. Onde as botas tropeçam. Arrastando-se pela madrugada de chuva.
Na economia, uma roda, uma ciranda. Ricos mais ricos. E pobres mais pobres. E o completar de um ano do falecimento da Fernanda Young. Sua lucidez ditou sua última crônica: “A cafonice brasileira”.
Como Fernanda, a "pensadora", existem muito poucas. Embora lembrando que ela também foi apaixonada. Por gente, textos e livros. Em conjunção direta com a cultura do Brasil. E com os movimentos da minoria.
Onde andará Fernanda? Em que dimensão estará, além das estrelas? A excêntrica carioca de Niterói no Rio de Janeiro. Dona de raro talento e incrível inquietação. Que escreveu e que viveu no Brasil dos paradoxos e dos absurdos.
Partiu aos 49 anos, no dia 25 de agosto do ano passado. Como um satélite rumo ao Cosmos. Deixou amigos, saudade e belos textos. O último, publicado pelo Jornal O Globo sentenciava: “A cafonice detesta a arte, pois não quer ter que entender nada. Odeia o diferente, pois não tem um pingo de originalidade em suas veias. Segura de si, acha que a psicologia não tem necessidade e que desculpa não se pede. Fala o que pensa, principalmente quando não pensa. Fura filas, canta pneus e passa sermões. A cafonice não tem vergonha na cara”.