Coluna do Brasil | Racismo estrutural, ou somos todos racistas

Pois bem, seis pessoas foram indiciadas pela morte do cidadão afro-brasileiro João Alberto Silva Freitas, espancado em Porto Alegre até a morte por seguranças de rede de Hipermercados Carrefour em 19 de novembro desse ano, um dia antes das comemorações do dia da Consciência Negra. Um dos fatos mais obscuros da história do Rio Grande do Sul agora segue aos tribunais com a delegada do caso dividindo entre toda a sociedade o racismo demonstrado pelos algozes, sem acusá-los deste crime.

"Nós fizemos uma análise conjuntural de todos os aspectos probatórios e doutrinários e concluímos, portanto, que o racismo estrutural que são aquelas concepções arraigadas na sociedade foram sim, fundamentais, no determinar da conduta dessas pessoas naquele caso. Sejam elas, de que cor forem, já que entre os seis, existiam também pessoas negras e, portanto, tiveram também, a mesma forma de comportamento. Ou seja, arraigado dentro do seu íntimo, concepções já antigas de discriminação por conta, não só, da sua cor de pele, da cor de pele da vítima, no caso. Mas também pela sua condição socioeconômica. Nós entendemos que, uma outra pessoa estando naquele momento, naquele lugar, poderia ter um tratamento diferenciado", disse a delegada Roberta Bertoldo.

Dessa forma a culpa foi dividida entre toda a sociedade. Ou seja, houve sim racismo, mas não por parte daqueles que acertaram os socos e pontapés sobre a vítima, mas de todos nós. Sim, o sangue dos close-ups dos celulares que registraram a barbárie realmente respingou sobre todos.  Para o professor Carl E. James, a sociedade é estruturada de maneira a excluir um número substancial de minorias da participação em instituições sociais, e isso caracterizaria o racismo estrutural: “Por muito tempo imperceptível, essa forma de racismo tende a ser de tamanha dificuldade de percepção tendo em vista um conjunto de práticas, hábitos, situações e falas enraizadas em nossa cultura, promovendo direta ou indiretamente, a segregação e preconceito racial”.

Mesmo sem recorrer aos professores, podemos ver o racismo estrutural com nossos próprios olhos. Quando escrevi aqui no Diário de Viamão a coluna denominada “Close-ups tétricos da sociedade homicida”, deixando claro meu ponto de vista ainda no dia 23 de novembro, não me faltaram críticas sobre a certeza a respeito do racismo. Mesmo depois de a sociedade, a rede Carrefour e agora a própria polícia terem admitido a prática decadente de segregação, ainda assim ela será negada. E tenho certeza de que qualquer um dos envolvidos que se candidatassem a algum cargo eletivo teriam grande chance de êxito. Por quê?

Respondo: porque a maioria das pessoas seguirá achando que não houve o crime de racismo. Seguirá achando que os algozes são injustiçados. Que a vítima realmente deveria morrer devido às informações sobre seu comportamento ou sua ficha criminal, ou por sua cor. É essa é a verdade. A sociedade já condenou João Alberto. E acolherá de braços abertos qualquer um dos suspeitos do assassinato.

Além dos seguranças Giovane Gaspar da Silva e Magno Braz Borges, que foram gravados espancando Freitas, a delegada Roberta Mariana Bertoldo da Silva também indiciou por homicídio triplamente qualificado a funcionária Adriana Alves Dutra e outros três empregados da rede de hipermercados: Paulo Francisco da Silva; Kleiton Silva Santos e Rafael Rezende.

Em vídeos gravados por testemunhas, Adriana aparece gravando as agressões de Silva e Borges contra Freitas e ameaçando pessoas que usavam seus celulares para registrar os fatos. Nos vídeos, Francisco é flagrado impedindo a mulher de Freitas de se aproximar do marido, enquanto Santos e Rezende ajudam Silva e Borges a imobilizar o autônomo que, em dado momento, alerta que não consegue respirar com os seguranças sobre ele, conforme o relato da Agência Brasil. Entretanto nenhum deles responderá pelo crime de racismo.

Pergunto-me: como condenar alguém por racismo por chamar o adversário de “macaco” ou jogar bananas no campo de futebol, entre outras ações desse nível? Fica difícil… No momento em que acionamos o “quarto do pânico” chamado “racismo estrutural” não podemos mais individualizar os racistas. Afinal, racistas somos todos…

 

Com essa coluna, me despeço do leitor do Diário de Viamão no que diz respeito ao ano de 2020, desejando a todos um Feliz Natal e um Ano Novo cheio de realizações. Sentirei saudades de sua companhia e opiniões. Abraços!

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