Existem livros e filmes e séries que mesmo se os lermos ou assistirmos já sabendo como acabam, ainda assim são interessantes. Gosto de reparar como alguns roteiros e enredos bem desenvolvidos são capazes de prender nossa atenção ao ponto de, mesmo que alguém nos conte o final, não diminuir nosso interesse pela trama. Isso ocorre porque o interessante mesmo é e sempre será a jornada, não o destino. Caso o mais importante fosse realmente como tudo acaba, não haveria nenhuma produção baseada em fatos reais, pelo final já ser conhecido.
Quando apenas o fim importa, deixamos de nos importar com o meio, e neste momento atitudes irresponsáveis serão justificadas em um piscar de olhos. Percebemos de forma mais fácil situações onde apenas o resultado interessa se nós formos objeto ou responsáveis por este resultado. É muito frustrante perceber quando outras pessoas, que não superaram todos os degraus da nossa jornada, têm a convicção de ter nossos resultados como garantidos em suas vidas. Seria como se elas já soubessem, ou esperassem, pelo fim da nossa história.
Neste caso, nosso destino se tornou mais importante, rebaixando nosso caminho a personagem secundário. Mas apenas quem já sentiu o peso da trajetória nos ombros – acredito que todos já tenhamos experienciado isso em maior ou menor grau – sabe o quão gratificante é atingir um objetivo pelo simples fato de ter enfrentado todas as etapas até alcançá-lo. Para caminhos fáceis demais, resultados pouco satisfatórios.
A consequência disso é inevitável. Aprendemos a valorizar o estágio onde estamos, descobrindo que não existe estágio final, porque sempre estaremos no atual. Sabendo disso, não aceitamos mais ninguém nos tendo como garantido na vida, porque quem nos dá por garantido não se preocupa com nossos sentimentos enquanto desbravamos nosso caminho. Para eles, o importante é chegarmos nos locais (por eles) pré-determinados. E o pior, quando chegamos, não fizemos mais que nossa obrigação.
Muitas vezes, estes lugares estabelecidos na mente das outras pessoas, estão onde nos tornamos úteis para elas. Para evitar a inutilidade, podemos acabar fazendo muito esforço no intuito de transformarmos o que sentimos em coadjuvante. Quando este autocontrole atingir o limite, não aguentaremos mais e simplesmente diremos adeus. Afinal, se controlar por quê? De nada adianta aprender controle se isso for evitar de explorarmos o que nos move. Ao encontrarmos algo capaz de nos fazer querer dar o próximo passo apesar do empenho necessário para dá-lo, sua utilidade deve ser relevada.
Pensar apenas no quão útil são nossas ações significa elevar o final da nossa história ao ponto principal da vida. E isso seria o mesmo que uma carreira ser mais importante pela aposentadoria do que pelo crescimento, ou um relacionamento ser mais importante pelo rótulo do que pela intimidade, ou uma viagem ser mais importante pelas fotos do que pela experiência. É justificar o meio pelos fins. É olhar para alguém e avaliar sua vida pela previsão do término, não por suas possibilidades.
A verdade é que muitas vezes não temos como medir as consequências e as dimensões dos nossos atos e das nossas escolhas apenas pela serventia. Se fosse assim, muitos teriam dificuldade de explicar a utilidade de um artista, de um filósofo, de um patinador, de um enxadrista. Pior ainda, alguém, algum dia, pode, por favor, me explicar pra que serve um escritor? Não serve para nada. Fazer algo que não serve para nada, não serve a sociedade, mas serve a nossa humanidade. Serve para nos mostrar do que somos capazes. Sua utilidade está em outro plano. Mas enquanto nossos resultados forem tidos como garantidos, estaremos apenas prestando serviço. Eu disse que esse texto não acabaria bem.