Estamos no século 21, e a saúde mental ainda é um tabu. Ainda recebo, em meu consultório, pessoas envergonhadas pela necessidade ajuda. Para muitos, o sofrimento psíquico tem sabor de derrota ou inadequação e, para outros, de enlouquecimento. Não há constrangimento em tropeçar e quebrar o braço, mas para alguns, aceitar sofrer por dificuldades e perdas é inimaginável.
A medicina precisou classificar os diferentes sofrimentos psíquicos para fins de organização e padronização. Há cada vez menos espaço para que o sofrimento seja encarado de forma adaptativa e natural. O advento das redes sociais intensificou a necessidade de parecermos felizes o tempo todo. O postado é frequentemente confundido com a realidade. Já vi pessoas duvidarem da veracidade do sofrimento alheio justificando terem visto “sorrisos” no Facebook.
Muito daquilo que a psiquiatria chama de “transtorno”, na psicanálise vemos como “estrutura”. A pessoa é a mesma, os sinais e sintomas também, mas a forma de percebe-la que é diferente. Alguém pode variar de humor e ter uma tendência a habitar polos motivacionais sem estar doente. Não sou contra a medicina ou psiquiatria, não é isso. Pelo contrário conheço profissionais maravilhosos. Sou contra tudo que olha e despreza a singularidade de um sujeito. Sou contra tudo que encaixota ou padroniza.
Somos seres repletos de subjetividade. É impossível definir que para 100% das pessoas, por exemplo, o período de luto saudável precisa ser de no máximo 15 dias. Não é algo quantificável desta forma. No entanto podemos inferir que talvez, para a maioria das pessoas, um ano seja tempo demais. E qual seria o critério para não estar mais em luto? Quando perdemos pessoas que amamos, certamente a saudade não passa nunca.
Da mesma forma muitas outras formas de sofrimento são resumidas a parâmetros e encaixadas, ou não, no critério de saúde. Prefiro usar a regra do “exagero”, tudo que é em exagerado pode estar inadequado: estar eufórico demais por muito tempo, estar triste demais por muito tempo, deixar de cumprir compromissos demais, ter sono demais, explodir demais… Não é o que sentimos que é um problema, mas suas consequenciais, os prejuízos deste sentimento em nossa vida.
Saúde mental não é não ter problemas, mas é conseguir lidar com esses problemas e ter um saldo positivo no enfrentamento a longo prazo. Voltando ao exemplo do luto, o importante é que após um determinado tempo o enlutado possa voltar as suas atividades normais, apesar da saudade.
A dor psíquica precisa de cuidado e tratamento como qualquer outra.