Excêntrica família

O psicanalista admitia que toda aquela gente era problemática. Também o Pai-de-Santo mais evoluído da cidade, chegara à conclusão semelhante. Um a um, em ocasiões diferentes, iam sendo analisados e benzidos. Enquanto falavam de seus problemas e inquietações. O veredito foi unânime: loucos. Uns, só um pouquinho. Outros muito, de “atar”. Dizia o médium: “O mais certo da família deveria estar internado a muito tempo. Com camisa de força e tudo”. Não era para se duvidar. Nem o psicanalista nem o Pai-de-Santo descobriram a razão daquele jeito maluco de viver. Normais não eram!

A mãe foi vista retirando a placa que informava o número da sua residência naquela rua: “Todo mundo tem placas com números, dizia. A minha casa não terá. Não quero ser igual a todo mundo”. Como se o número ali exposto não fosse necessário. O carteiro, por certo, teve muito prejuízo. Cobradores também. E de resto, pelo correio convencional, nenhum  convite para festas receberiam.  

Em outra ocasião, uma vizinha  passou pelo jardim até chegar a porta principal da casa. Estas visitas eram semanais. A vizinha tinha muito apreço por aquela família. Porque aquele anti-convencionalismo, a impressionava. Eram diferentes e muito alegres. Contavam piadas, comemoravam festas, comiam pratos deliciosos. E sabiam na hora certa, serem ainda espiritualizados. Recebiam com maestria parentes e vizinhos sempre com mesa farta.

Mas agora, a vizinha que os visitava até se assustou. O jardim onde havia somente rosas vermelhas, se  duplicou em apenas sete dias.

 Soube-se que a dona da casa pacientemente colocara entre as rosas reais plantadas na terra, algumas artificiais. E o jardim ficou, de uma hora para outra, muito mais colorido: metade  rosas vermelhas verdadeiras, metade de plástico. Que, de quebra, transformou o jardim em algo muito vistoso. Rosas vermelhas, amarelas, roxas e brancas. O jardim ficara insólito. Por isto mesmo, chamou a atenção. Perturbando a vizinha.

A família era composta por três irmãos, pai, mãe, tios, tias, primas e primos. As tias geralmente tinham estórias muito engraçadas para contar quando se reuniam. A patriarca, morava num sítio. E lá, a vida era meditativa e rural. Na urbanidade de Porto Alegre, ao contrário, existia mais movimento e mais insanidade. Mas a vida era uma grande bênção. Realmente era. Dificilmente e raramente entristeciam-se. Mentes alegres atraem alegria.

Passaram-se alguns anos. Agora as lembranças começavam a surgir. Boas e alegres lembranças. De um tempo, uma casa e uma família excentricamente leve. Descompromissada com a realidade. Que vivia  como quê, encenando uma grande comédia teatral. Onde nunca existiu cenas tristes. Só alegrias indecifráveis.

 E onde a loucura corria paralela à linha do amor. “Descobrindo o sentido da loucura nos encontraremos um pouquinho”, falou o patriarca numa inesquecível comemoração de fim de ano. Depois vinhos, doces e abraços.

 

 

 

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