Na Câmara, secretário da Saúde repete falas de Bolsonaro

Aragonês (com o microfone) assumiu pasta há menos de um mês

Glazileu Aragonês fez sua primeira visita à Câmara como secretário da Saúde de Viamão. Foi até a Casa do Povo falar sobre como o município protegerá a população da COVID-19. Ao lado da adjunta Thais Schadeck, do diretor do departamento de Vigilância Clayton Ferreira e do secretário da Fazenda Cristiano Bernardes, respondeu a questionamentos dos vereadores e falou brevemente sobre recursos para a pasta.

Mas a sessão legislativa desta terça-feira (19) foi como um dos causos do Analista de Bagé. Aragonês, nascido na mesma cidade em que a personagem de Luis Fernando Verissimo, viu, ouviu – e fez – discursos dignos das crônicas de humor da década de 1980.

Os vereadores revezaram o divã, quer dizer, a tribuna. Falaram, perguntaram, fizeram lives "ao vivaço" para exibir as performances. Só não estavam interessados nas respostas. Quando o secretário passou a responder as perguntas, seis já tinham ido para casa, e parte dos demais estava em um bate-papo tão descontraído, que o presidente Dilamar de Jesus precisou interroper os trabalhos para pedir silêncio aos nobres edis.

O analista se diz "mais ortodoxo que pomada Minancora", mas em determinados momentos, teve vereador que resolveu ser menos ortodoxos do que a famosa "técnica do joelhaço" da personagem bageense. Evandro Soares (DEM) e Armando Azambuja (PSDB) discutiram no finalzinho, interrompendo o secretário.

Aragonês não é formado na área como o conterrâneo de Bagé. Entende de gestão por conta dos tempos de Corsan, mas não teve tempo de familiarizar-se com as coisas da Saúde. Tanto que pediu tempo aos parlamentares para se habituar ao cargo e poder mostrar trabalho ao município.

O piscanalista da fronteira recorria à assistente, Lindaura, para abordar casos mais difíceis. Tal qual, Aragonês foi assistido pela adjunta Thais Schadeck, por Clayton Ferreira e Cristiano Bernardes para explicar questões como o crescimento do número de casos de dengue na cidade e os repasses federais e estaduais ao município para o combate ao coronavírus.

Quando teve a palavra, assim como o folclórico gaúcho criado por Verissimo, Aragonês foi marcante e ilustrativo. E demonstrou alinhamento com o discurso do presidente Bolsonaro, que também não é médico, ao afirmar que "70% da população será infectada e sentirá os efeitos da COVID-19". 

Provocado pelo vereador Guto Lopes (PDT), o secretário não respondeu sobre como lidaria com uma superlotação dos leitos de UTI. Guto lembrou que todos as 15 vagas no Hospital Viamão estão ocupadas – e nenhuma é por COVID-19.

De fato, se apenas 1% da população local for infectada (2,5 mil pessoas), a cidade entrará em colapso.

Lá pelas tantas, o secretário também deixou escapar que está descontente com as frenquentes intervenções do Ministério Público. Citou que tem dias que "tem 15 mensagens do MP para tratar", e que assim, "francamente, fica difícil trabalhar". Quando percebeu o que havia dito, baixou tom, dizendo que entende a crise pela qual a secretaria passa e o papel da Justiça.

Deixou claro também que não gosta do elevado nível de terceirização existente na Saúde do município:

– Hoje em dia, há 312 funcionários da Saúde e um contingente total de 872 pessoas que prestam serviços à pasta. Esperamos que, em médio ou longo prazo, possamos ter um corpo funcional de Viamão, com terceirizadas somente para serviços de apoio – externou.

Francinei Bonatto (PSDB) levantou uma questão polêmica que há muito está viva nos bastidores: Aragonês era proprietário de um imóvel alugado para a Prefeitura, onde funciona o Centro de Atenção Psicossocial Renascer, no Tarumã. Em 2019, o agora secretário mantinha contrato com dispensa de licitação e recebeu R$ 59.880. Questionado se ainda existe o contrato, se ainda é dono do prédio e se os pagamentos eram feitos pela Administração ou por empresa terceirizada, Aragonês acabou não respondendo.

Sobre o combate efetivo ao vírus, lembrou dos 36 casos confirmados, lamentou o óbito ocorrido na semana passada, mas diz acreditar que a situação está controlada no município. Criticou o papel da Imprensa na cobertura da pandemia e, apesar de reclamar da divulgação dos fatos, confirmou que servidores foram afastados em diferentes setores da Prefeitura por suspeita de contágio. Citou especificamente os três profissionais do Samu que aguardam resultados dos exames em casa. Mas a coluna tem relatos de casos na secrearia de Obras e até no prédio da Prefeitura.  

O secretário informou aos vereadores que a pasta já recebeu mais de R$ 1,8 milhão para implementação em ações de combate ao coronavírus, além de R$ 100 mil em recursos estaduais de emenda parlamentar para custeio.

– A partir de um plano de contingência, desdobrado em plano de ação, estabelecemos ações para que possamos atender a população de forma adequada. O Fundo Municipal de março e abril está sendo utilizado para a aquisição de insumos, em que se inserem os Equipamentos de Proteção Individual – EPI, além da contratação de serviços de limpeza e pulverização – diz Aragonês.

Outra notícia é que o município dispõe de 1,5 mil testes para COVID-19. Recordou que o Hospital Viamão receberá mais 10 leitos do Estado, conforme a coluna antecipou no artigo Instalação de novos leitos de UTI em Viamão é aguardadada, porém não trouxe a informação tão esperada: a data em que os equipamentos sairão do campo das promessas.

Quando deu a palavra ao diretor da Vigilância, Clayton Ferreira, mesmo nas entrelinhas, ficou claro que os gestores da Saúde local não veem necessidade da montagem de um hospital de campanha por aqui. Vale relembrar o próprio Aragonês dizendo que "70% da população terá infecção pelo novo coronavírus" e que precisa trabalhar para "evitar um colapso do sistema”.

Clayton explicou que, se houver necessidade, provavelmente a montagem da estrutura se dará ao lado da secretaria da Saúde, onde já funcionou um Pronto Atendimento, mas tudo depende do avanço dos casos na cidade.

Por fim, Aragonês também foi cutucado sobre o uso da cloroquina, ao que não comentou, mas deixou escapar um "não sou messias" durante a sabatina na Câmara. Sempre é delicado fazer comparações, mas diante das falas "presidenciáveis" não pude deixar de lembrar daquela charadinha infantil: "Tem olho de gato, rabo de gato, orelhas de gato… O que é? 

Soma, multiplica, divide e desconta o pouco tempo no comando da pasta, o gestor, que é natural de Bagé e agraciado com o título de Cidadão Viamomense, teve nota 8 nessa primeira impressão que deixa. Que ele não faça como Bolsonaro e desdenhe da "gripezinha". Prefiro que se porte como a personagem da terra natal e mantenha o povo em casa, pois como diz o Analista, “quem gosta de aglomeramento é mosca em bicheira”.

 

EM TEMPO: a visita aos vereadores aconteceu no dia em que o Brasil bateu o recorde negativo de mortes por COVID-19. Em nenhum momento a Itália, por exemplo, teve 1.179 vidas perdidas em 24 horas.

Participe de nossos canais e assine nossa NewsLetter

Compartilhe esta notícia:

Facebook
WhatsApp
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Conteúdo relacionado

Receba nossa News

Publicidade

Facebook