Sankofa Viamão | A política ambiental desastrosa do governo brasileiro

No último 22 de setembro, o Presidente da República Jair Bolsonaro, em discurso na ONU, utilizou os povos indígenas como bode expiatório para eximir seu governo da culpa pelas queimadas que ocorrem na Floresta Amazônica e no Pantanal. Sem fonte ou qualquer comprovação científica, ele disse que o desastre ambiental provocado pelas queimadas é culpa de práticas utilizadas por povos indígenas e caboclos que habitam esses dois importantes biomas sul-americanos. Ou seja, a prática do governo federal tem sido a de atacar os povos originários do país, esquecendo a importância deles e os direitos adquiridos por eles desde a promulgação da Constituição de 1988. Os direitos garantidos aos indígenas ainda estão em um lento processo de consolidação, porém já apareceram discursos desconexos como o do ex-ministro da educação Abraham Weintraub, discordando do uso do termo “povos indígenas” na fatídica reunião ministerial do dia 22 de abril deste ano. Entretanto, no momento no qual o governo precisou se livrar da culpa pelo desastre ambiental, o Presidente não pestanejou em utilizar o termo povos indígenas para dizer que a culpa dos incêndios nas florestas era deles.

            Evidentemente, o uso dos recursos naturais é inevitável por parte de qualquer grupo humano, independente da sua etnia. No entanto, os impactos ambientais causados pelos indígenas são muito pequenos em comparação ao que vem ocorrendo no Brasil desde a vinda dos portugueses em 1500. A dominação portuguesa na parte mais a leste da América do Sul sempre foi caracterizada pela exploração de recursos. Os primeiros 30 anos foram marcados pela extração do pau-brasil no litoral do Oceano Atlântico, seguido nos séculos seguintes pelos latifúndios de cana-de-açúcar e a mineração, sendo que a região amazônica entrou no mapa da exploração com a descoberta das drogas do sertão (guaraná, cacau e outros recursos encontrados na região Norte do Brasil) pelos bandeirantes que corriam atrás de indígenas e de negros para serem escravizados. Já no século XX, a região foi explorada depois pelo Brasil independente com o objetivo de produzir borracha. Ou seja, enquanto os indígenas sempre utilizaram os recursos naturais das florestas brasileiras como forma de subsistência, o Brasil forjado pelos portugueses fez uso desses mesmos recursos como forma de obter elevado lucro com comércio internacional e uso desenfreado das matérias-primas encontradas na sua colônia americana.

            É inclusive fundamental recordar a fala do ministro do meio ambiente Ricardo Salles na mesma reunião do dia 22 de abril de “aproveitar a pandemia de Covid-19 como forma de seguir com o desmatamento da Amazônia, passando a boiada”. Ou seja, embora o tempo tenha passado e não estejamos vivendo mais o Período Colonial da História do Brasil, algumas questões da época persistem e se fortaleceram durante essa gestão. O governo federal está mantendo e reforçando a lógica predatória de exploração dos recursos naturais do país. Queimadas estão sendo feitas sob pretexto de aumentar os latifúndios ligados ao agronegócio, o qual na maioria das vezes não está pensando em garantir o abastecimento interno da população brasileira, e sim garantir o lucro exportando seus produtos para Estados Unidos, China e até mesmo países da Europa, enquanto que o mercado interno sofre com aumentos abusivos, como o caso de um elemento básico da alimentação do brasileiro: o arroz.

            Além do mais, se não houver a preservação da Floresta Amazônica e do Pantanal, poderemos ter agravamentos nos problemas ambientais que já estamos percebendo nos últimos anos. O aumento da temperatura do planeta, que já é um fenômeno constatado na prática, pode levar à desertificação do interior do Rio Grande do Sul, por exemplo, o que poderia condenar a agropecuária no estado, inviabilizando as atividades vinícolas na Serra, a produção de soja ou a criação de gado. Sendo assim, a preocupação do Presidente da República não deveria ser a de culpar indígenas, que hoje correspondem a menos de 1% da população brasileira e vivem em economia de subsistência, e sim de cuidar dos patrimônios naturais do Brasil como forma de garantir o futuro da própria economia do país. Sem a Floresta Amazônica e o Pantanal teremos um futuro sem recursos, pois essas florestas são cruciais no controle climático. Não é momento de o governo federal encontrar desculpas, e sim de reconhecer os seus próprios erros e lutar pela preservação dos recursos naturais do país. Como sabemos que não há essa conscientização por parte do governo federal, é fundamental que a oposição no Congresso Nacional e nós mesmos, que somos parte da sociedade brasileira, cobrarmos medidas que garantam esta preservação das nossas florestas, além da garantia dos direitos aos povos indígenas, que não merecem ser usados por esse governo.

 

Ígor Andrade Cardoso é especialista em ensino de História e de Geografia.

 

*As publicações nos espaços de opinião são responsabilidades de seus autores e não refletem, necessariamente, a opinião do Diário de Viamão.

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