Se Bolsonaro, com crimes em todas as áreas, conseguir escapar do sistema de Justiça, ninguém mais poderá ser condenado por crime algum. Nem os manés presos em Brasília.
Faltava à ficha corrida do sujeito o comando de uma operação de contrabando de joias. Não falta mais.
A frase mais incisiva do chefe dos contrabandistas, ao se defender da denúncia sobre o presente da Arábia Saudita, é uma confissão de que algo está errado.
Bolsonaro disse em declaração à CNN:
“Estou sendo acusado de um presente que eu não pedi, nem recebi. Não existe qualquer ilegalidade da minha parte. Nunca pratiquei ilegalidade. Veja o meu cartão corporativo pessoal. Nunca saquei, nem paguei nenhum centavo nesse cartão”.
O raciocínio parte da premissa de que ele pode ter pedido algo, mas nega que tenha pedido. Ora, é uma hipótese que ele nem deveria considerar na sua defesa.
E o acréscimo do cartão no argumento demostra outra barbeiragem, como ato falho, porque ele é, sim, acusado com provas de que usou o cartão para gastos pessoais.
É missão urgente da imprensa reconstituir o caminho das joias. Um personagem é decisivo para o esclarecimento da origem do contrabando de R$ 16,5 milhões, o tenente da Marinha Marcos André dos Santos Soeiro.
Soeiro, o dono da mochila, integrou a comitiva do então ministro Bento Albuquerque (Minas e Energia) na viagem de outubro de 2021 à Arábia Saudita.
A muamba deve ter sido entregue ao ministro, que pode ter incumbido o tenente da missão de servir de mula de Bolsonaro até Guarulhos.
O tenente é quem pode dizer onde, quando e de quem recebeu as joias que seriam para Michelle, em que condições e por que decidiu guardá-las numa mochila, dentro de um cavalo dourado que teria sido quebrado na operação.
O contrabando envolve dois personagens com algo em comum. Quem recebe a missão de carregar as joias é um tenente.
E quem, no último gesto desesperado, vai de Brasília a Guarulhos, no dia 29 de dezembro do ano passado, para tentar liberar as joias apreendidas, é o sargento Jairo Moreira da Silva.
Soeiro era assessor de Albuquerque. Silva era da área da Ajudância de Ordens de Bolsonaro.
Dois militares da Marinha se transformam em protagonista, o primeiro, e em coadjuvante, o segundo, do contrabando. Um militar como mula da Arábia Saudita ao Brasil, e o outro como candidato a mula de Guarulhos para Brasília.
E o ex-ministro Bento Albuquerque, que recebeu os mimos e tentou liberar as joias no aeroporto, é almirante.
Mauro Cesar Barbosa Cid, ex-assessor-chefe militar da Ajudância de Ordens da presidência, era o chefe do sargento Silva e quem o enviou a Guarulhos.
Cid é coronel do Exército e investigado por possível envolvimento com o caixa dois do cartão corporativo de Bolsonaro. É um militar bem enrolado.
Bolsonaro já havia conseguido atrair coronéis para dentro e para o entorno do Ministério da Saúde, onde deveriam ajudar generais no combate à pandemia.
A principal ajuda de alguns deles, segundo a CPI da Covid, foi o envolvimento em tentativa de tráfico de vacinas que nem existiam, que seriam vendidas ao governo.
Bolsonaro fez, em quatro anos de governo, com que militares se envolvessem em ações delituosas.
O contrabandista deformou o caráter de parte das Forças Armadas ao agir como mafioso sob a tutela dos militares de alta patente, para compensar o que ele não conseguiu ser.
Está cada vez mais evidente que Bolsonaro empregou 6 mil militares no governo como garantia de que teria de alguns deles, como retorno, a proteção que precisava para agir como criminoso.