Coluna do Brasil | Angu de caroço

Pois então, menos de uma semana depois dos mais acalorados debates a respeito de ter ocorrido ou não ato de racismo durante a abordagem que resultou no homicídio de João Alberto Silveira Freitas, na semana passada, em Porto Alegre, a rede Carrefour se manifestou sobre o assunto. E adivinhe qua foi a conclusão? Será necessária a criação de um "comitê externo de livre expressão sobre diversidade e inclusão" para assessorar, “de maneira livre e independente”, a rede de hipermercado na elaboração de ações contra o racismo em todas as unidades. Ou seja, a rede francesa envolvida no ataque desmesurado que custou uma vida decidiu que vai tomar providências contra o racismo. Diante disso, fica cada vez mais difícil entender o que leva às pessoas a não quererem encarar o fato de que vivemos sim em uma sociedade racista e homicida.  

Entre as ações do Comitê, está a adoção de uma política de tolerância zero ao racismo e à discriminação por razões de raça e etnia, e uma cláusula de combate ao racismo será inserida em todos os contratos com fornecedores do Carrefour. Por que será? Será que é porque não houve racismo? Aqueles que acreditam que não há racismo no Brasil seguirão a vociferar sobre o “exagero da mídia”. Mesmo assim, a empresa determinou que irá criar um programa de qualificação diferenciada para funcionários negros para promover a “aceleração na carreira no Carrefour, permitindo que cheguem mais rapidamente a cargos de liderança”.

Cláusulas antirracismo serão inseridas em contratos com fornecedores. E aqueles que já têm essa cláusula em contrato serão valorizados. Foram anunciadas também metas anuais para a formação e ascensão em diferentes áreas, de pessoas negras. A rede francesa de hipermercados deseja iniciar imediatamente “a transformação radical do modelo de segurança”, com apoio de empresas especializadas para “estabelecer regras rigorosas de recrutamento e treinamento”.

Conforme o documento, todo trabalho ocorrerá em parceria com organizações reconhecidas do movimento negro no combate a todo tipo de discriminação e de violência aos direitos humanos e fundamentalmente ao famigerado racismo estrutural. O documento cita ainda a contratação de novos colaboradores “com percentual mínimo de 50% de negros entre os novos contratados” assim como ações voltadas ao desenvolvimento do “empreendedorismo negro nas comunidades no entorno das lojas de Porto Alegre”.

Notem então quantos protocolos relativos a questão racial passarão a ser adotados pela instituição, mas que deveriam ser de rotina. O que fortalece ainda mais a tese de racismo durante o ataque dos seguranças ocorrido na véspera do Dia da Consciência Negra.

Ainda uns poucos atos fragmentados em homenagem ao “Beto” foram registrados em cidades da Região Metropolitana durante o final de semana. Embora sejam mudanças que tenham ocorrido tarde demais para os familiares e amigos da vítima, tomara que representem o início da mudança de comportamento da sociedade de forma geral.

Então volto a perguntar aos leitores como fiz em minha coluna publicada na segunda passada: “será que bateriam tanto no homem se ele fosse branco?”, e dessa vez quem responde é o Carrefour: “NÃO, NÃO BATERIAM.” A falta de treino adequado somado ao desrespeito à vida de um negro foram os ingredientes básicos desse “angu de caroço” (situação embaraçosa ou imprevista), me apropriando dessa expressão surgida na senzala, entre escravos, e que virou arte em canção de Edu Lobo.
Pois é, presidente Bolsonaro e vice-presidente Mourão, parece que pelo menos as instituições já começam lentamnete a admitir que o racismo exista no Brasil, embora vocês o neguem, seguidos pelo coro de seus numerosos eleitores.

E com essa triste melodia complemento a coluna lembrando que minha previsão para as eleições majoritárias em Porto Alegre se confirmou. Não sou vidente, apenas analiso o comportamento da população da cidade ao escolher seus representantes. Teremos de nos contentar com políticos ligados a tragédias e tramoias sendo agraciados com novamente com secretarias, cargos, CC´s, entre outros mimos da sociedade porto-alegrense. Por isso terminarei essa coluna com o mesmo questionamento da anterior: como suportar tamanha hipocrisia?
 
Uma boa semana a todos!

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