Associo-me ao artigo de Leonardo Sakamoto, publicado pelo UOL.
Reproduzo na íntegra, por necessário no momento em que já há calendário para saída do isolamento social, mesmo com o crescimento exponencial do contágio pela COVID-19, e Viamão já tive sua 'carreatas da morte', como o Diário de Viamão tratou em artigos como Parem Viamão que eu quero descer!; declaro-me Inimigo do Povo, amigo da vida, A pá de cal na carreata: decreto fecha o comércio em todo o RS; Entenda e Justiça recebe pedido de cumprimento de sentença para organizadores da carreata do comércio.
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Coronavírus não dá a mínima se você acredita nele ou não para poder te infectar – afinal, é um vírus. Nas redes sociais, há relatos de pessoas infectadas ou que estão com entes queridos sofrendo por Covid-19, independentemente de terem menosprezado ou não a pandemia. O problema é os discursos de negacionistas que continuam a responsabilizar terceiros pelos infortúnios que eles ajudaram a criar com seu comportamento irresponsável contribuem para dificultar o combate à pandemia.
Num primeiro momento, o coronavírus é uma fraude, uma "histeria" coletiva criada por uma narrativa inventada pela China para destruir os mercados ocidentais e não difere de qualquer outra "gripezinha". A Organização Mundial da Saúde e a imprensa são responsabilizadas por criar pânico sobre algo que não existe. E tudo isso levará apenas à queda do PIB e à perda de empregos.
Depois, quando ela bate à nossa porta, a culpa se torna de governadores e prefeitos que decretam isolamento e distanciamento social para retardar o avanço da doença e a superlotação de hospitais. Pois, o que funciona mesmo, é o isolamento de idosos e pessoas imunodeprimidas – que devem ficar em casa enquanto os outros precisam voltar ao trabalho. Alguns sugerem até "campos de concentração" como resposta.
Quando o coronavírus contamina alguém que mora na mesma casa, apesar dos cuidados tomados para preservar a pessoa devido à crença na ficção do "isolamento vertical na mesma residência", a culpa é dos médicos e cientistas que não distribuem cloroquina em massa para "prevenir" e "tratar" a doença. O medicamente vem sendo prescrito em casos individuais e pode ajudar, mas não há provas que subsidiem a distribuição em massa devido a seus efeitos colaterais.
Há quem consiga, após uma tragédia coletiva ou individual, deixar a negação e chegar à aceitação (talvez passando por raiva, barganha e depressão, se seguirmos o modelo de Kübler-Ross), em um luto pelo fim da pessoa ignorante que ela era. Ignorância que pode acometer esquerda e direita, cristãos e ateus.
Mas há também quem seja incapaz de assumir que agiu de forma irresponsável em meio à crise. E, apesar dos avisos, preferiu acreditar nas mensagens de "médicos" formados pela Universidade do WhatsApp com residência em Infectologia no Hospital do Google.
Para essas pessoas, a culpa por seus problemas nunca, mas nunca, passa por si mesmas e pelas decisões que tomam. Por exemplo, acreditar no presidente da República e não no ministro da Saúde.
Jair Bolsonaro é um dos que tentam transferir sua responsabilidade pela contenção e mitigação da pandemia para terceiros. Na quarta (8), disse que "cada família tem que cuidar dos mais idosos, não pode deixar na conta do Estado". Defendeu que se mantivesse dois metros de distância dos idosos em casa, ignorando que, nas favelas brasileiras, nas residências de cômodo único, não chegar a essa distância de pais e avós significa não entrar na casa.
Além dos problemas trazidos por uma pandemia assassina transmitida pelo contato social, o Brasil também gasta tempo preciosos para enfrentar esse naco de negacionistas que colocam em risco a si mesmos e aos outros. E energia, pois a cada mudança no cenário, eles preferem terceirizar a responsabilidade para outro, como se nada tivesse acontecido.
O seu comportamento acaba criando entraves para a aplicação de soluções cuja eficácia vem sendo comprovada por outros países.
Nem todo os que estão na rua, contudo, desrespeitam as quarentenas porque querem.
Os profissionais de saúde sabem dos riscos que correm, inclusive de morte, mas, mesmo assim, estão na linha de frente do combate à pandemia. Bem como os trabalhadores e trabalhadoras de serviços essenciais, que seguem se expondo diariamente para que o restante da sociedade funcione.
Isso sem falar dos milhões que são obrigados a sair de casa para buscar o sustento porque o governo atrasou – e muito – o pagamento do auxílio emergencial a informais e desempregados. A renda básica de R$ 600,00 deveria ter sido liberada quando a quarentena foi recomendada. Ou micro e pequenos empresários que estão à beira da falência porque o governo apresentou medidas insuficientes para garantir seus negócios.
Fala-se que a pandemia criou uma espécie de "Arca de Noé" pós-moderna, em que os escolhidos podem se isolar, enquanto uma parte tem que ir para o sacrifício. Por conta disso, uma parte da sociedade deveria ser eternamente grata à outra – o que, sabemos, não irá acontecer. Porque se parte consegue ser heroicamente solidária, outra é e sempre vai ser covardemente egoísta.
Desconfio que o mundo que sairá disso não será melhor do que o que temos agora. Mas a pandemia por ajudar a muita gente a amadurecer, aprendendo que seus atos trazem consequências para si mesmas e para os outros. Talvez até o presidente aprenda. Ou não.
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